Reforma Trabalhista tem caráter transformador, diz ex-presidente do TRT/RS

Flavio Portinho Sirangelo
10/11/2017
Zero Hora Duas Visões

Para Flavio Portinho Sirangelo, a sociedade brasileira não poderia mais prescindir da renovação da CLT

O mundo do trabalho no Brasil tem um encontro marcado com a sua história neste dia 11, com a entrada em vigência da Lei 13.467/2017 _ a lei da reforma trabalhista. A nova lei tem um caráter transformador da cultura envelhecida e conflituosa que dominava as relações de trabalho no país. Desconectada dos avanços da realidade, a CLT vinha sendo suplantada por enunciados da jurisprudência dos tribunais trabalhistas, que, por vezes, funcionavam como corpos legislativos.

A inaptidão da antiga CLT para organizar as relações de trabalho contemporâneas se faz sentir pelo crescimento descomunal da litigiosidade perante a Justiça do Trabalho, que alcançou a marca de 5,4 milhões de processos no final de 2016. O desacerto entre a CLT e a atualidade brasileira pode ser mensurado também por dados do IBGE. A título de exemplo, nota-se que mais de 20 milhões de brasileiros trabalham “por conta própria”, sem carteira assinada, engrossando a formação do “mercado de trabalho informal”, onde não são efetivados os direitos sociais dos trabalhadores dessas ocupações.

A nova lei tem o sentido de trazer arejamento ao contexto de rigidez extremada da CLT dos anos 1940. Alteram-se, com a reforma, centenas dos seus dispositivos, exatamente para prestigiar os atributos de simplicidade e clareza que as boas normas legais devem ter, de modo a que sejam facilmente compreendidas e corretamente aplicadas _ e que não funcionem mais como alimentadoras de conflitos.
Tem-se, agora, a regulação de direitos para novas modalidades de vínculos de trabalho, distintas do modelo único de emprego que foi concebido para dar proteção aos trabalhadores do setor da indústria da primeira metade do século 20 _ estes, sim, verdadeiramente hipossuficientes para merecer a rigorosa tutela do Estado. Todavia, a falta de regulação para práticas que passaram a ser adotadas no mercado de trabalho desde há muito tempo causava sensação de insegurança jurídica e gerava natural desestímulo para novas contratações.

O novo estatuto ainda tem o mérito de garantir maior autonomia às negociações trabalhistas e de promover a liberdade sindical, seguindo a tendência de decisões do Supremo Tribunal Federal, nas quais esses valores constitucionais foram reafirmados.

Por fim, ao sistematizar de forma congruente as regras processuais da Justiça do Trabalho, a nova lei induz os partícipes dos processos à observância da boa-fé objetiva e acerta ao criar custos de sucumbência e outras sanções para condutas aventureiras.

Nesse cenário, é justo esperar que os aplicadores da nova lei, ao interpretarem esse novo direito, observem os deveres básicos de suas investiduras e apresentem justificações racionalmente válidas nas suas sentenças. No Estado constitucional, não há lugar para “decisionismos”. Nele, os membros do Poder Judiciário possuem responsabilidades que são incompatíveis com discursos emocionais e posturas ideológicas ou corporativistas.
A sociedade brasileira não poderia mais prescindir da renovação da CLT. E os brasileiros têm direito à expectativa de uma jurisdição consciente do caráter imperativo da lei, enquanto produto da soberania, conforme o processo legislativo do qual participam através dos representantes que elegeram para esse fim.

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