As multas dos Procons e os grandes fornecedores

[:pt]A multa pecuniária é uma das principais sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC) contra os fornecedores de produtos e serviços que cometem infrações à legislação. Seu valor pode chegar a alguns milhões de reais, conforme o porte e a receita do fornecedor infrator, dentre vários outros critérios estabelecidos pelo Decreto 2181/1997.

Os PROCONs, que compõem o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, aplicam penalidades usualmente com base em Portarias emitidas pelos próprios, que preveem mecanismos e critérios de cálculo das multas.

Recentemente, o PROCON de São Paulo emitiu a Portaria Normativa 029/2021, prevendo que “No caso de conduta infrativa imputada a uma unidade específica do autuado, será considerada como condição econômica a receita bruta individual do estabelecimento indicado no auto de infração”.

Nesse sentido também já são as Portarias de PROCONs de algumas outras localidades do país, que bem diferenciam uma infração restrita a um determinado estabelecimento de uma infração que abrange toda a rede do fornecedor. A primeira considera a receita bruta daquele estabelecimento específico onde apurada a infração e a segunda a receita total do fornecedor.

Ocorre que, quando se está diante de um fornecedor de grande porte com atuação nacional, que não atua por diferentes estabelecimentos, esta divisão proposta pelos PROCONs não gera o efeito prático adequado, mas sim excessivo ônus a tais fornecedores. Isto porque vários são os grandes fornecedores de produtos e serviços que estabelecem relação direta com o consumidor a partir de um só estabelecimento. O caso principal é o dos fornecedores com atuação a partir de uma única “loja” virtual, que atende os consumidores de todo o país. Exemplos desses fornecedores são os fabricantes de produtos com venda direta ao consumidor, as redes de comércio eletrônico de produtos, os marketplaces, e os fornecedores de serviços online.

Quando ocorre uma infração por um desses fornecedores a um único consumidor ou a um número ínfimo de consumidores, por exemplo (e sem que tenha ocorrido infração a uma coletividade de clientes), o fornecedor fica sujeito à imposição de uma multa elevadíssima e totalmente desproporcional à infração e à extensão do dano suportado pelo consumidor, na medida em que é considerada, pelo órgão sancionador, a sua receita bruta total. Assim, não são raras as situações de aplicação de multas milionárias a grandes fornecedores a partir da apuração de uma infração isolada com um número contido de consumidores.

Mas não é só. Em razão da autonomia dos PROCONs, esse grande fornecedor ainda estará sujeito à aplicação de outra penalidade, que pode ser tão elevada quanto a já recebida, por um órgão de outra localidade. Nesses casos, o fornecedor precisará estar atento ao fato gerador de tais penalidades para invocar seu direito de remessa do caso à Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON), procedimento previsto na legislação, a fim de evitar a efetiva penalização multiplicada pelos fatos de origem comum.

Nitidamente, as normas dos PROCONs ainda são voltadas a um modelo tradicional de negócio, baseado no varejo de lojas físicas, quando fazem a distinção desta maneira (estabelecimento vs. sede). É preciso, no entanto, que as normas sejam adaptadas com os olhos abertos aos diferentes modelos de negócio que atingem os consumidores, prevendo mecanismos de fixação de multas que cumpram a finalidade sancionadora prevista em lei, mas que também observem a razoabilidade e a proporcionalidade entre a pena, a infração e a extensão dos sujeitos atingidos.[:]

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