Impactos da inteligência artificial no fortalecimento da confiança nas relações de sharing economy

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Cássio Monteiro Rodrigues
Doutorando e Mestre em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Especialista em Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ). Professor convidado de cursos da PUCRio e do CEPED-UERJ. Advogado.

 

SUMÁRIO: 1. Introdução; – 2. O modelo negocial da sharing economy; – 3. Importância da confiança contratual na economia compartilhada; – 4. Impactos da inteligência artificial na economia compartilhada: incremento da confiança e possíveis deveres para as plataformas digitais; – 5. Considerações finais; – 6. Referências bibliográficas.

 

1. Introdução

Nas últimas décadas, as novas Tecnologias da Informação e Comunicação, comumente chamadas de “TIC’s”, são representativas de inovações tecnológicas aptas a compartilhar e a distribuir conteúdo, bem como a facilitar a interlocução entre os usuários, tais como websites, e-mail, redes sociais etc. A sociedade de consumo atual foi extremamente impactada pelo uso crescente das novas tecnologias, principalmente em ambiente digital, com novas formas de organização e interações tecnológicas nunca vistas (talvez apenas em telas de cinema).

A sociedade contemporânea experimenta outra revolução industrial – denominada de Revolução 4.0 [1]
– que altera totalmente a forma e aquilo que fazemos e produzimos, por meio das novas tecnologias, tais como o big data, armazenamento em nuvem, e, especialmente, da inteligência artificial, que permite que máquinas e robôs aprendam, coletem e armazenam dados em quantidade impensável, e realizem operações em velocidades impossíveis para o ser humano, apresentando um cenário de possibilidades inimagináveis. [2]

A título ilustrativo, uma pesquisa da PWC [3] afirma que a inteligência artificial irá impactar a economia mundial, até 2030, em expressivos 15,7 trilhões de dólares, notadamente pelos aspectos de ganhos de produtividade e aumento da demanda de consumo que a inteligência artificial proporciona, devido ao constante aprimoramento de produtos e serviços. Em paralelo, na edição de 17 de março de 2011, a revista Time, em atenção aos reflexos do avanço tecnológico na economia e mercado de consumo, incluiu a prática do compartilhamento na sua lista das 10 ideias que iriam mudar o mundo. Quase uma década depois, ao que tudo indica, a previsão não falhou.

Nos últimos anos, o modelo negocial do consumo compartilhado [4] tem observado um crescimento exponencial, muito impulsionado pelo desenvolvimento tecnológico, que tem permitido a difusão de aplicações para dispositivos eletrônicos oferecendo essa modalidade de contratação. Os contratos de economia de compartilhamento afirmam-se, assim, no cenário global como modelo atraente de organização da atividade produtiva e de troca de bens e serviços, transformando a estrutura do mercado, a forma de acesso e circulação de bens, de prestação de serviços e do seu compartilhamento. [5]

As plataformas de compartilhamento ganham espaço nos mais variados setores econômicos, tais como lazer, transporte de pessoas ou de carga, locação de bens, habitação etc. (pense-se, por exemplo, nas plataformas Airbnb, Ebay, Rappi, Dog Hero, Uber, 99, BlaBlaCar, Zopa, Bliive, entre muitas outras). Com esse crescimento, paradigmas tradicionais da teoria geral dos contratos são desafiados pela inovadora estrutura dessas relações, [6] a começar por seu modelo plurilateral (normalmente triangular), no qual deveres distintos emergem para um mesmo centro de interesses a depender da sua posição diante dos demais sujeitos em relação.

Dos diversos problemas jurídicos que podem exsurgir da sharing economy, merecem particular destaque as dificuldades inerentes ao estabelecimento da confiança contratual entre os usuários, elemento imprescindível para viabilizar o compartilhamento de bens nesse novo modelo negocial. Para Ricardo Abramovay, além da horizontalização das relações, a economia do compartilhamento possui como uma das principais transformações viabilizadas pela evolução tecnológica “a emergência de uma economia da atração pautada na confiança existente em relações interpessoais”. [7]

A confiança atua como elemento que permite não apenas a aceitação pelos usuários do que é fornecido, como fomenta a própria utilização da plataforma de compartilhamento. E, na construção dessa confiança mútua, a inteligência artificial também se faz presente, facilitando a aproximação das partes e a oferta de produtos e serviços, mediante maciça análise de dados, comportamento e preferências dos usuários, com mecanismos de avaliação que permitem o incremento da tutela da confiança nessas relações.

Contudo, o uso da tecnologia não pode ocorrer de maneira desmedida, sem atentar para a preservação da função social e da dignidade da pessoa humana. Deve-se, por exemplo, assegurar que a coleta de dados seja feita de maneira responsável, com a garantia do correto tratamento e proteção das informações obtidas dos usuários, em atendimento à transparência exigida pela boa-fé nesse novo modelo negocial.

O presente trabalho irá analisar o fenômeno do novo modelo negocial da economia compartilhada, com destaque para o papel central que o elemento da confiança exerce, bem como os efeitos positivos decorrentes do uso da inteligência artificial para incrementar a confiança nas plataformas digitais e nas relações contratuais firmadas. Como exemplo prático, o estudo explorará, pontualmente e sem pretensão de esgotar o tema, a aplicação direta da inteligência artificial por aplicativos de mobilidade urbana.

 

2. O modelo negocial da sharing economy

Tão vertiginoso foi o crescimento do setor da economia compartilhada nos últimos anos que a dogmática jurídica ainda não foi capaz de aquilatar seu conceito (desconhecido, em larga medida, até mesmo pelos próprios agentes de mercado que dela se utilizam). [8]

Muito menos existe consenso doutrinário com relação aos efeitos jurídicos produzidos para os contratantes, o que dificulta sobremaneira a correta qualificação desse modelo negocial e sua adequação às estruturas normativas contratuais existentes. Em linhas gerais, porém, costuma-se observar que os contratos de sharing economy traduzem um novo momento econômico, em que a lógica proprietária é substituída por novas formas de aproveitamento dos bens jurídicos, mais racionais e eficientes, que garantem o acesso às utilidades por eles proporcionadas, independentemente da aquisição da titularidade de direitos reais sobre eles. [9]

A nota característica da sharing economy, assim, parece estar na busca pelo compartilhamento ou pela utilização racional dos bens, para a qual a construção de um forte sistema jurídico de tutela da confiança tem sido considerada essencial. [10] O ponto de partida para a configuração dessa estrutura relacional é a criação de uma plataforma de compartilhamento, [11] termo que costuma designar não apenas o aplicativo eletrônico, mas também a própria entidade responsável por operá-lo. A plataforma costuma ser detentora da tecnologia da informação que permite conectar os demais agentes que serão integrados à relação, sendo encarregada, na maioria das vezes, do papel de intermediária e organizadora do compartilhamento. [12]

Ao entrar em operação, a plataforma dedica-se a arregimentar usuários-fornecedores, que com ela contratam, anuindo com termos e condições gerais que os autorizam, então, a se utilizarem do arcabouço tecnológico por ela disponibilizado para compartilharem (rectius, ofertarem) bens ou serviços ao público. Assim ocorre, por exemplo, com o motorista que realiza viagens por intermédio da plataforma Uber: esta, segundo seus próprios termos e condições de uso, não presta serviços de transporte ou de logística, os quais se consideram fornecidos, não pela plataforma, mas por “parceiros independentes” – justamente, os motoristas. [13]

Paralelamente, ocorre também a contratação entre o usuário-consumidor e a plataforma de compartilhamento. Nesta ocasião, o primeiro aceita as condições estipuladas por esta última no tocante à intermediação do negócio (que podem abranger desde as obrigações das partes até, em certos casos, o próprio preço dos serviços). Mas a triangulação da relação apenas ocorrerá com uma nova declaração de vontade por parte do usuário-consumidor, ao solicitar um bem ou serviço específico de um dos usuários-fornecedores (que poderá ou não ter sido escolhido pela própria plataforma, a depender do caso). O vínculo formado, em seguida, entre os dois usuários pode assumir diversas aparências, [14] como se se tratasse de uma relação jurídica convencional de locação, prestação de serviços, compra e venda, permuta, entre outros, sendo possível, ainda, a depender de seu objeto, que se assemelhe a um contrato atípico. [15]

Forma-se, assim, uma estrutura negocial inovadora, plurilateral, entre a plataforma (que poderá assumir diferentes papéis, desde mera intermediária até efetiva fornecedora) [16] e os seus usuários, em uma relação triangular relativamente incomum no direito contratual. Do ponto de vista jurídico, como seria de se esperar, esse caráter inusitado preocupa, por gerar dúvidas quanto ao regime normativo aplicável a tais relações.

Constata-se, por exemplo, não ser certa a adaptação desse modelo à normativa ordinária de tutela do consumidor, [17] pois a posição contratual assumida pela plataforma pode acabar afastando deveres e responsabilidades que lhe seriam aplicáveis caso se considerasse uma fornecedora típica. [18] Além disso, não se pode deixar de notar que nem sempre o usuário-fornecedor desenvolve atividade dotada da habitualidade [19] que seria exigida para que pudesse ser considerado um fornecedor [20] à luz do art. 3º do CDC.

Assim, poderia acontecer que, em certos contratos de economia compartilhada, ao menos em uma análise puramente estrutural, não se caracterizasse nenhuma relação de consumo propriamente dita, [21] nem entre os usuários e a plataforma (que, ao se posicionar nessa relação jurídica sui generis, deliberadamente refuta o papel de fornecedora de produtos ou serviços), nem entre o usuário-consumidor e o fornecedor (que, muitas vezes, desempenha a atividade oferecida pelo aplicativo de forma esporádica, sem habitualidade, além de, não raro, ostentar assimetrias em face da plataforma que remetem à figura clássica do consumidor [22] – já tendo recebido, por isso, até mesmo a alcunha de prosumer,[23] um profissional-consumidor). Vale dizer: em grande parte dos casos, pelo menos duas das três partes envolvidas em uma relação de economia compartilhada ostentam clara vulnerabilidade contratual, mas não existe nenhum consenso mínimo quanto a aplicar-se ou não a elas o diploma normativo mais protetivo de contratantes vulneráveis conhecido no direito brasileiro: o CDC.

Esse cenário de incerteza não deve, contudo, constituir óbice, a priori, ao fortalecimento da confiança contratual e de sua tutela jurídica. As novas ferramentas tecnológicas, em especial o uso da inteligência artificial, pode consistir em instrumento essencial para aperfeiçoar a confiança e transparência nas relações de sharing economy, com a ressalva de que processamento e coleta de dados observa as devidas garantias constitucionais, em verdadeira promoção da função social do contrato e da dignidade humana.

 

3. Importância da confiança contratual na economia compartilhada

Como dito, o próprio conceito de economia de compartilhamento é controverso, [24] mas é possível extrair um elemento comum a todas as relações desse novo modelo negocial: a confiança. Essas relações contratuais se desenvolvem por aquilo que se chama de mercado de dois lados, que consubstancia um marketplace caracterizado pela “presença de dois lados distintos cujo benefício último deriva da interação via uma plataforma comum”. [25]

É a confiança que viabiliza o surgimento e manutenção de cadeias comerciais interligadas, com engajamento todos os sujeitos contratuais acima referidos, na qual ela assume o papel de elemento de união ou de suporte às relações, permitindo, ainda, o controle de preço e de qualidade dos produtos ou serviços, pois são os próprios usuários que o fazem (normalmente em tempo real).

O uso da plataforma digital de compartilhamento induz, assim, um efeito positivo de rede, que justifica o seu sucesso, no qual a procura por certo bem aumenta em relação à quantidade de usuários que o fornece, pois o produto ou serviço terá uma valorização maior tanto quanto seja usado (e bem avaliado), [26] eliminando barreiras de assimetria informacional que o comércio de bens normalmente experimenta.

Portanto, o elemento que dá liga à cadeia de contratações de compartilhamento é a confiança, [27] que assume papel central na economia compartilhada “tornando possível não só sua própria existência, mas bem como o motivo do sucesso desta novel forma de se contratar”. [28] A velocidade e a dinâmica das modificações de hábitos e comportamentos da sociedade, atingidas pela evolução tecnológica, principalmente voltada aos ambientes virtuais, alça a confiança contratual a outro patamar, para além daquele “clássico” papel das origens das relações comerciais, para se tornar “a principal amálgama das plataformas de compartilhamento”. [29]

É justamente por meio da confiança que os usuários de ambientes digitais (espaços repletos de risco e complexidade) acatam com exposições maiores e não costumeiras a riscos (como aceitar carona de estranhos), até mesmo com entrega de dados pessoais às plataformas de compartilhamento, sem preocupações de como se dará o tratamento e uso dessas informações. [30]

Vinicius Marques de Carvalho e Marcela Mattiuzzo exemplificam, com precisão, a forma como se dá esse processo:

“‘temos que a plataforma em questão é o aplicativo Uber (P) e os grupos de usuários são os motoristas parceiros (M) e os passageiros (C). Como já visto, os problemas deste mercado estão relacionados à qualidade do serviço oferecido e aos preços praticados, na medida em que C não possui todas as informações necessárias para selecionar M da melhor maneira possível. A inovação trazida por P foi precisamente um método para que o grupo C avalie o grupo M (e vice-versa), de forma a garantir níveis de confiança suficientes para viabilizar o serviço. A questão dos preços foi resolvida também por meio da rede. Como o aplicativo é capaz de identificar onde se localizam os membros de M e transmitir essa informação a C, a insegurança em relação à oferta diminuiu. Também foi possível determinar a tarifa instantaneamente de acordo com o balanço entre oferta e demanda, ou seja, uma alocação adequada de valores a depender do número de membros de M e C utilizando a plataforma num dado momento. [31] ”

A dinâmica da contratação da economia compartilhada, pautada no acesso aos bens, em verdadeiro “consumo colaborativo”, revela uma “economia da atração”, na qual o usuário vê suas demandas atendidas na exata medida de suas necessidades pessoais, que é possibilitada pelo uso da tecnologia e pela confiança, realizando profunda alteração nas formas de atividade econômica. [32]

O hospedeiro da Airbnb tem, provavelmente, mais atração por um imóvel de um proprietário que já recebeu diversas avaliações positivas; o passageiro da 99 costuma preferir corridas com motoristas mais bem avaliados ou que tenha comentários positivos de outros usuários; os usuários da Bliive, por sua vez, embora detenham conhecimentos técnicos sobre os serviços que prestam, podem não ter informações suficientes sobre os serviços que recebem ou sobre a própria plataforma, sendo essencial o papel exercido pela confiança nas contratações e “trocas” de serviços.

Mas, a confiança não atua somente nos centros de interesse dos usuários. A atividade da plataforma de compartilhamento também deve adotar comportamentos positivos que fomentem a confiança entre os usuários e, consequentemente, mais contratações. Merecem especial destaque as situações que envolvem o dever de informar e transparência da plataforma sobre os detalhes da contratação, quanto ao tratamento dos dados pessoais, controle de preços, e, mais especificamente, os sistemas de avaliação de usuários implementados, a fim de garantir, simultaneamente, a transparência e a segurança dos usuários-consumidores, facilitando a tomada de decisão na contratação dos mais variados produtos e serviços.

A divulgação dessas informações pela plataforma é vital para a formação de um ambiente de plena confiança entre os usuários, [33] de modo a estabelecer condições previsíveis às partes, indo além de mera facilitação de comunicação. O objetivo deve ser o de eliminar riscos do compartilhamento com totais desconhecidos, pois os negócios de economia compartilhada demandam transparência e os usuários somente decidem pela contratação após a ciência de quem solicita e fornece o produto ou serviço.

É a confiança, renovada e ressignificada no âmbito da economia do compartilhamento, para gerar amplos efeitos jurídicos, caracterizados, principalmente, pela transparência produzida pelas plataformas digitais, viabiliza todo o sistema de contratação, monitoramento, precificação e colaboração. Dessa forma, quem contrata uma corrida por meio de plataforma de compartilhamento já conhece de antemão o usuário-motorista que irá realizar o transporte, o hóspede do Airbnb vai poder conhecer tanto as características do imóvel quanto do proprietário, e assim por diante, resultando em um “efeito em escala: quanto mais usuários e mais operações on-line, maior o potencial de aumento das intermediações em razão de mais informações e confiança estabelecida pelas plataformas”. [34]

Os mecanismos de avaliação e reputação funcionam como captadores e fomentadores da confiança do usuário-consumidor, a auxiliar tomada de decisão na contratação de um produto ou serviço com a agilidade exigida pelo modelo da economia compartilhada, [35] pautada pela análise da eficiência e responsabilidade construída pelo usuário-fornecedor numa plataforma específica (avaliações positivas ou negativas), [36] que consubstancia verdadeira moeda, denominada de “capital de reputação”, e quanto maior a reputação, mais confortável o usuário se sentirá em contratar (tanto com o fornecedor quanto com a própria plataforma de compartilhamento). [37]

Ao possuir acesso à avalição do usuário-fornecedor (motorista, por exemplo), o usuário-consumidor terá noção da eficiência e aceitação daquele perante os demais usuários da plataforma e, principalmente, se presta bem a sua atividade, permitindo decisões mais informadas e eliminando receios e riscos da contratação com pessoas desconhecidas.

Trata-se de verdadeira ferramenta calcada na confiança e de produção colaborativa, permitida somente por efetiva transparência da plataforma de compartilhamento. O “sucesso” do usuário-fornecedor será determinado pela sua avaliação, que funciona como via de mão dupla, pois quanto melhor a avaliação, maior a reputação, e, ao mesmo tempo, cria-se incentivo à melhor prestação do serviço ou produto, pois os usuários futuros pautarão a contratação justamente por ela.

Importa destacar que o sistema de avaliação de usuários impulsiona o aumento da confiança também em relação à plataforma em si, pois ela se tornará mais confiável aos olhos dos usuários-consumidores na medida em que ocorram cada vez mais prestações satisfatórias. [38] Cabe destacar, por fim, que o sistema de avaliação possui também como objeto o usuário-consumidor, funcionando como verdadeiro eliminador de desconfianças, ao permitir que os usuários-fornecedores avaliem seus contratantes, que possuirão sua própria reputação, [39] podendo até chegar ao cenário de recusa de prestação de serviços por parte de possíveis contratados. [40]

Nesse cenário de importância da confiança e do sistema de avaliação de usuários para melhoria e aumento das contratações sujeitas às plataformas digitais, cresce o uso das tecnologias da informação para impulsionar o aludido sistema, tais como dos mecanismos de inteligência artificial, para fins de incremento da confiança e segurança dos usuários contratantes, mas que também pode resultar em deveres jurídicos para as plataformas digitais.

 

4. Impactos da inteligência artificial na economia compartilhada: incremento da confiança e possíveis deveres para as plataformas digitais

A inteligência artificial é um tema que fascina o ser humano e é abordado em diversas áreas do conhecimento, principalmente em obras de ficção científica. [41] Hoje em dia, é uma tecnologia que se faz presente em diversos aplicativos e programas de uso cotidiano das pessoas, tais como o Google, o Instagram, a Netflix, dentre outros, que nos últimos anos experimentaram grande melhora no fornecimento de seus produtos e serviços devido ao uso da inteligência artificial.

Pode-se atribuir ao surgimento do estudo do tema a Alan Turing, na década de 1950, com sua obra Computing Machinery and Intelligence, [42] dando origem ao procedimento até hoje chamando de “Teste de Turing”, cujo objetivo é testar a capacidade de um robô ou de uma máquina de se comportar tal como um ser humano (leia-se, pensar como um ser humano).

Pode-se dizer que a inteligência artificial é representada por máquinas que possuem sistemas de inteligência e habilidades necessárias para realizar tarefas que exigem, normalmente, o uso e a aptidão inerentes à inteligência humana. [43] Em descrição mais objetiva, remeteria à capacidade de máquinas ou computadores aprenderem, se comunicarem e tomarem decisões como se humanos fossem. Para Barr & Feigenbaum a inteligência artificial é “a parte da ciência da computação que compreende o projeto de sistemas computacionais que exibam características associadas, quando presentes no comportamento humano, à inteligência”. [44]

As máquinas e os computadores dotados de inteligência artificial possuem como missão procurar, compreender e prever padrões ao analisar dados disponíveis, de modo a encontrar os respectivos resultados ou tomar decisões com base neles. [45] Assim, a inteligência artificial é responsável por verdadeira mudança de compreensão e percepção da relação entre o ser humano e a tecnologia, permitindo à raça humana executar tarefas antes nunca imaginadas.

A inteligência artificial possui três grandes áreas: Machine Learning, [46] Deep Learning e Natural Language Processing, sendo a primeira a mais utilizada em geral, principalmente pelos aplicativos de economia compartilhada, pois é aquela que possibilita que a máquina se desenvolva com aprendizado por meio das experiências próprias em análise de dados, sem que haja programação específica para tanto, ou seja, são computadores ou sistemas capazes de entender e se adaptar aos dados que analisa. [47]

A facilidade e precisão das tomadas de decisões provenientes da inteligência artificial são de grande valia às relações socioeconômicas contemporâneas, mitigando riscos possíveis de prever, pois a quantidade de dados e informações é cada vez maior, sendo impossível de a mente humana processar no tempo necessário. Essa característica sobressai em setores de mercado em que a assimetria de informação é elevada, sendo útil o processamento de dados veloz por algoritmos capazes de simplificar as decisões econômicas, aumentar a eficiência ou “ampliar as possibilidades de monetização de serviços digitais a partir da personalização do conteúdo e do marketing digital”. [48]

Essas estratégias de personalização do conteúdo e de marketing direcionado, somada às técnicas de data mining e ao big data, podem ser de grande valia às plataformas de compartilhamento na função de incrementar a confiança das contratações e nos próprios usuários, permitindo levar ao usuário-consumidor produtos ou serviços que ele têm buscado, mas que não conseguia encontrar ou sequer sabia que existia.

Para além da utilização publicitária da inteligência artificial, aplicação interessante dessas ferramentas no âmbito da economia do compartilhamento é feita pela 99 Tecnologia, em seu aplicativo de mobilidade urbana “99”. A plataforma digital da 99 faz utilização de inteligência artificial para o monitoramento do perfil das solicitações de corrida feitas pelo aplicativo e detecta eventuais incidentes durante as corridas, por meio de câmeras de alta definição, além de viabilizar que usuárias mulheres peçam corridas apenas de motoristas do sexo feminino – na aplicação 99 Mulher, lançado no início do ano na cidade de Manaus/AM – , mapeando horários e trajetos de cada pedido das usuárias, para encontrar motoristas mulheres e bem avaliadas, incrementando a segurança e confiança na contratação da plataforma. [49]

A inteligência artificial possibilita que a plataforma, em curtíssimo período de tempo, investigue todos os seus dados e informações na busca de padrões de comportamento e eventos associados a incidentes de segurança, como o horário em que a corrida é solicitada, a forma e pagamento e o histórico de corridas dos usuários, para mapear os trajetos costumeiramente realizados e em quais dias da semana, bem como usuários que podem representar “chamadas de risco” pelo aplicativo (como corridas com pagamentos em dinheiro solicitadas durante a madrugada para endereços não costumeiros, permitindo ao usuário-motorista rejeitar o passageiro).

Por óbvio, é um método que depende da alimentação de dados pelo próprio usuário, em que a confiança é plenamente alcançada quando fornecidos dados mais confiáveis ao cadastro, como número de CPF, dados bancários e endereço residencial. Apesar do tratamento de dados pessoais dos usuários, essa sistemática visa à proteção e à segurança destes, sejam consumidores ou fornecedores, incentivando cada vez mais as contratações dentro do ambiente da plataforma.

Isso chama a atenção para o fato de que o uso das tecnologias de inteligência artificial carrega consigo tanto riscos quanto benefícios. [50] Caberá à plataforma respeitar a coleta e tratamento lícito dos dados obtidos de seus usuários, sensíveis ou não, que devem ser limitados à quantidade e finalidade necessárias para o devido incremento da confiança no ambiente digital das plataformas.

Para se ter noção do risco do tratamento de dados pelas plataformas de mobilidade urbana, veja-se o exemplo dado por Chiara de Teffé e Anderson Gabriel, no qual a análise contínua dos dados de geolocalização dos usuários pode “facilmente revelar não só a identidade de cada ‘ponto anonimizado’ do mapa, mas também gostos, rotinas, preferências sexuais e até expor infidelidades conjugais”. [51]

Como se sabe, ao proceder à análise de dados, com ou sem o emprego de inteligência artificial, a plataforma de compartilhamento também estará sujeita aos mais variados regimes jurídicos além daquele da proteção de dados (que aguarda, ansiosamente, a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados – Lei nº 13.709/2018), [52] tais como o da responsabilidade civil, da propriedade intelectual, da concorrência desleal e do direito do consumidor, com normativas específicas de proteção da informação, as quais deverá estar atenta para não violar deveres legais que lhes são atribuídos por estas legislações.

Por fim, apesar da ausência de vigência da Lei Geral de Proteção de Dados, deve-se destacar que o ordenamento jurídico brasileiro é voltado para a proteção da pessoa humana, possuindo disposições específicas de tutela da privacidade e dos dados pessoais (em âmbito constitucional e infraconstitucional, podendo-se falar, inclusive, na existência de um princípio autônomo da proteção de dados pessoais, [53] sendo “possível extrair princípios essenciais para a proteção de dados pessoais, que são de observância obrigatória, quais sejam: a minimização dos dados, finalidade, transparência, informação, qualidade dos dados, não discriminação, adequação, prevenção e segurança.” [54]

Desse modo, importante que as plataformas de compartilhamento ofereçam tanto aos usuários quanto aos órgãos de fiscalização a transparência necessária para a compreensão do modo de processamento dos dados coletados e a finalidade para a qual são utilizados, de modo a tornar compreensível e minimamente controlável a sua destinação. [55]

Não se ignora que a coleta e tratamento de dados dos usuários é essencial para a manutenção das plataformas e aperfeiçoamento do sistema de avaliação, sendo indispensável ao fortalecimento da confiança. Contudo, importa ressaltar que a transparência adequada e razoável funcionará não apenas para incremento da confiança na própria plataforma, como fará vias de “prestação de contas”, auxiliando em eventuais casos de responsabilidade civil, [56] inclusive como prova ou excludente do dever de indenizar.

 

5. Considerações Finais

As relações de sharing economy, assim, inovadoras que são no meio social e econômico, e também no plano jurídico, são construídas com base num alicerce comum: a confiança. É ela que permite que a lógica proprietária perca, progressivamente, sua relevância, na medida em que é substituída por meios mais eficazes e racionais de aproveitamento dos bens jurídicos, em um cenário no qual a titularidade de direitos reais cede espaço ao compartilhamento. [57]

A tutela e o incremento da confiança, então, se mostram indispensáveis a esse novo modelo negocial, pois proporciona eliminação de riscos e desconfianças entre os usuários, facilitando a tomada de decisão de contratar (com completos desconhecidos). A confiança assume papel de destaque e, aliada ao cumprimento do dever de transparência por parte das plataformas de compartilhamento, torna possível todo o sistema dessa “economia de atração”, desde a precificação e monitoramento das ofertas à efetiva contratação e colaboração. Nesse cenário, a evolução tecnológica permite que as plataformas de compartilhamento estejam em constante aprimoramento de seus sistemas de confiança (caracterizados pelo binômio avaliação-reputação).

Portanto, o uso de ferramentas de inteligência artificial, como nos exemplos voltados a conferir maior segurança aos usuários – caso do mapeamento de horários e trajetos perigosos de corridas solicitadas ou a possibilidade de uma usuária mulher solicitar apenas motorista mulher – e, até mesmo, ao tratamento dos dados pessoais fornecidos, revela-se como fator associado diretamente ao incremento da confiança e pode representar em fortalecimento chave da posição de mercado de determinada plataforma, pois, como visto, quanto mais utilizados os serviços em um determinado marketplace, mais procurado e tido por confiável ele será, fomentando um número cada vez maior de contratações.

Por certo, o uso de novas tecnologias não vem desacompanhado de riscos e deveres. O desafio, então, está na adoção da inteligência artificial de maneira adequada pelas plataformas, com transparência e razoabilidade, para realização de tratamento de dados dos usuários na exata medida necessária ao fomento ou incremento da confiança e do respectivo sistema de avaliação. Essa atividade, necessária à sistemática da sharing economy, não pode ocorrer com eventual desvio de finalidade e deve atender aos princípios e normativa que regulam a matéria, eis que a proteção de dados pessoais configura princípio autônomo no ordenamento pátrio, resguardando-se, assim, a plataforma de compartilhamento de potenciais riscos e responsabilidades, entregando um ambiente de contratação cada vez mais confiável aos usuários.

 

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[1] BBC. O que é a 4ª revolução industrial – e como ela deve afetar as nossas vidas. Disponível em: [https://www.bbc.com/portuguese/geral-37658309]. Acesso em: 09.06.2020.

[2] PORCEL Y GABRIEL, Gabriela. SOUZA, Iasmin Fausto Cavalcanti de. FUMAGALLI, Luis André Wernecke. A economia criativa e a criação de valor compartilhado: o papel destes modelos frente ao atual momento econômico-social. Revista da FAE. v. 1, n. 4 (2019), pp. 168-184, p. 174.

[3] PWC. Sizing the prize What’s the real value of AI for your business and how can you capitalise? Disponível em: [https://www.pwc.com/gx/en/issues/data-and-analytics/publications/artificial-intelligence-study.html]. Acesso em: 13.06.2020.

[4] Segundo Caroline MELLER-HANNICH, a “economia compartilhada estabelece uma nova relação entre os atores econômicos. No início, compartilhar era conhecer novas pessoas, conectar-se, economizar recursos devido a aspectos sociais e sentimentais. O consumo colaborativo ideal está agora expandindo oportunidades pessoais, melhorando a qualidade dos bens e serviços ofertados, reduzindo custos transacionais e aumentando a autonomia” (Economia compartilhada e proteção do consumidor. Revista de Direito do Consumidor, vol. 105/2016, mai.-jun./2016, p. 19). No mesmo sentido, para Juliet SCHOR, “enquanto muitas das plataformas de maior destaque na economia do compartilhamento começaram nos Estados Unidos, o compartilhamento se tornou um fenômeno global, tanto por conta da expansão de plataformas para outros países, quanto porque a ideia de compartilhar foi recepcionada ao redor do mundo. Plataformas estão se proliferando na Europa, onde cidades estão se tornando centros de práticas de compartilhamento. Paris, por exemplo, se tornou lar anual da festa ‘OuiShare’. O mundo árabe tem uma série de novas inovações de compartilhamento. Ano passado, o governo do Equador lançou o Buen Conocer, uma iniciativa para reimaginar radicalmente o país, de acordo com princípios de compartilhamento – redes abertas, produção aberta, e uma economia dos comuns. Enquanto as políticas desses vários esforços variam ao redor do mundo, o que é comum a elas é o desejo dos participantes de criar sociedades conectadas mais justas, mais sustentáveis, e mais conectadas socialmente” (Debatendo a economia do compartilhamento. In: ZANATTA, R.; PAULA, P.; KIRA, B. (Org.). Economias do Compartilhamento e o Direito. Curitiba: Juruá, 2017, p. 23).

[5] BUSCH, Cristoph et al. The Rise of the Platform Economy: A New Challenge for EU Consumer Law? EuCML Journal of European Consumer and Market Law. Issue n. 1, vol. 5, feb./2016, p. 3; MELLER-HANNICH, Caroline. Zu einigen rechtlichen Aspekten der “Share-Economy”. [2014] WM 2337. No direito brasileiro, Claudia Lima MARQUES e Bruno MIRAGEM afirmam que, nesse modelo negocial, “a prestação de serviços ou a oferta de bens podem ser realizadas por intermédio de uma plataforma digital, por pessoas que não atuam necessariamente como profissionais, nem se organizam sob a forma empresarial” (Economia do compartilhamento deve respeitar os direitos do consumidor. Conjur, 23.12.2015). Já Carlos Affonso de SOUZA e Ronaldo LEMOS destacam que o acesso gerado aos bens e aos serviços na sharing economy “cria as condições para o desenvolvimento de um fenômeno denominado ‘consumo colaborativo’, que privilegia justamente o acesso em detrimento da aquisição de propriedade sobre os bens que não serão explorados em todo o seu potencial” (Aspectos jurídicos da economia do compartilhamento: função social e tutela da confiança. Revista de Direito da Cidade, vol. 8, n. 4, 2016, p. 1760).

[6] Como se sabe, a expressão “relação jurídica” pode ser usada, ora em seu sentido mais técnico (que aprecia a correlação entre uma situação jurídica subjetiva ativa e a situação passiva que lhe é contraposta), ora em sentido amplo, para fazer referência à complexa rede de direitos e deveres em que se traduz, juridicamente, uma relação socioeconômica. A respeito, permita-se a remissão a SOUZA, Eduardo Nunes de. Situações jurídicas subjetivas: aspectos controversos. Civilistica.com. Rio de Janeiro: a. 4, n. 1, 2015, pp. 7-8.

[7] ABRAMOVAY, R. “A Economia Híbrida do Século XXI”. In: COSTA, E.; AGUSTINI, G. (Orgs). De Baixo para Cima. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2014, pp. 104-134.

[8] Dennis VERBICARO e Nicolas PEDROSA afirmam que “entende-se a economia de compartilhamento como um fenômeno que promove o compartilhamento de bens e serviços, que se encontram subutilizados ou ociosos, por meio de canais digitais que conectam consumidores que se propõem a compartilhar seus bens com base na confiança” (O impacto da economia de compartilhamento na sociedade de consumo e seus desafios regulatórios. Revista de Direito do Consumidor, vol. 113, 2017, p. 462). Nesse sentido, Rafael A. F. ZANATTA aduz que, “para solucionar tal impasse, existente há quase dez anos, o ensaio defende a utilização da expressão economias do compartilhamento, aqui definida em termos amplos como sistemas socioeconômicos mediados por tecnologias de informação direcionados ao compartilhamento de recursos para fins de consumo ou de produção. O conceito de economias do compartilhamento é abrangente o suficiente para incluir sistemas de utilização de recursos ociosos para consumo” (Economias do compartilhamento: superando um problema conceitual. In: ZANATTA, R.; PAULA, P.; KIRA, B. (Org.). Economias do compartilhamento e o Direito. Curitiba: Juruá, 2017, pp. 79-106); Por sua vez, Juliet SCHOR chega a afirmar que “criar uma definição sólida de economia do compartilhamento, que reflita o uso comum, é praticamente impossível” (Debatendo a economia do compartilhamento, cit., p. 24). Por fim, vale mencionar o trabalho de Rachel BOTSMAN, para quem se trataria de um sistema “construído de redes distribuídas de indivíduos conectados e comunidades, em oposição a instituições centralizadas, transformando o modo como produzimos, consumimos, financiamos e aprendemos” (The Sharing Economy Lacks a Shared Definition. Co-Exist Magazine, 21.11.2013).

[9] Nesse sentido, afirma-se mesmo que o consumo colaborativo “concebe novos modelos de negócio não mais concentrados na aquisição da propriedade de bens e na formação de patrimônio individual, mas no uso em comum – por várias pessoas interessadas – das utilidades oferecidas por um mesmo bem” (MARQUES, Cláudia Lima; MIRAGEM, Bruno. Economia do compartilhamento deve respeitar os direitos do consumidor, cit.). Cláudia Lima MARQUES também destaca o papel da tutela da confiança no cerne da definição do “sistema negocial de consumo” da economia de compartilhamento e afirma que esses contratos são “relações de confiança” (A nova noção de fornecedor no consumo compartilhado: um estudo sobre as correlações do pluralismo contratual e o acesso ao consumo. Revista de Direito do Consumidor, vol. 111. São Paulo: Revista dos Tribunais, mai.-jun./2017). Nas palavras de Carlos Affonso Pereira SOUZA e Ronaldo LEMOS, a economia de compartilhamento representa “uma nova etapa no processo de desenvolvimento econômico, simbolizado pela superação da lógica de consumo em massa […], por um momento em que o mercado, […] passa a privilegiar novas formas de acesso a bens e a serviços”
– um modelo que, devido ao fato de promover o uso e acesso eficiente aos bens, “atende às demandas relativas à sua função social […], o uso da tecnologia da informação aperfeiçoa a prática da transparência nas relações contratuais, promovendo um fortalecimento dos ditames da boa-fé objetiva” (Aspectos jurídicos da economia do compartilhamento: função social e tutela da confiança, cit., pp. 1758 e 1764-1765).

[10] Nesse sentido, cf. SMORTO, Guido. Verso la disciplina giuridica della sharing economy. Mercato concorrenza regole, a. XVII, n. 2, ago./2015, pp. 259-260.

[11] “Rispetto ai tradizionali fornitori di servizi che operano attraverso internet, le piattaforme online assumono la funzione di marketplace (mercati), ossia di intermediari estranei allo scambio, il cui compito è dar vita ad una piazza virtuale dove agenti economici indipendenti concludono affari tra loro. Dato che il successo commerciale di queste piattaforme è strettamente legato al buon funzionamento del mercato che offrono e alla riuscita degli scambi che intermediano, le stesse hanno un evidente interesse a ridurre i rischi e garantire un mercato sicuro” (SMORTO, Guido. La tutela del contraente debole nella platform economy. Giornale di diritto del lavoro e di relazioni industriali, n. 158, 2018, p. 426).

[12] Claudia Lima MARQUES aponta que a plataforma de compartilhamento como criadora da estrutura e organizadora do compartilhamento configurará um fornecedor aos olhos da lei e atrairá a incidência das normas do CDC para a relação como um todo, pois o “site ou aplicativo atua não apenas como um facilitador, mas sim como aquele que torna viável e, por vezes, estrutura um determinado modelo de negócio. Em outros termos, o site ou aplicativo permite o acesso à ‘highway’ e atua como guardião deste acesso, um gatekeeper (‘guardião do acesso’), que assume o dever, ao oferecer o serviço de intermediação ou aproximação, de garantir a segurança do modelo de negócio, despertando a confiança geral ao torná-lo disponível pela Internet. No direito brasileiro, estarão qualificados indistintamente como provedores de aplicações de Internet, de acordo com a definição que estabeleceu o art. 5º, VII c/c art. 15 da Lei 12.965/2014” (MARQUES, Claudia Lima. A nova noção de fornecedor no consumo compartilhado, cit., p. 6).

[13] Termos e condições disponíveis no sítio eletrônico da Uber, com última alteração em 20.1.2020.

[14] Acerca da terminologia aplicável, Juliet SCHOR conclui: “Os consumidores são aqueles que estão comprando serviços, enquanto prestadores ou fornecedores os estão oferecendo. Os participantes podem estar em ambos os lados de uma transação. Usuários também é um termo frequentemente empregado desta maneira. Por exemplo, o Airbnb chama anfitriões e hóspedes de usuários, mas em outras plataformas como, por exemplo, Lyft ou Uber, os usuários seriam passageiros, e não os motoristas” (Debatendo a economia do compartilhamento, cit., p. 26).

[15] CARVALHO, Joana Campos. A proteção dos consumidores na sharing economy. In: Estudos de direito do consumo: homenagem a Manuel Cabeçadas Ataíde Ferreira. Nova Lisboa: Deco, 2016, p. 304.

[16] “Most online platforms present themselves as mere facilitators, brokers or ‘digital clearinghouses’ rather than as sellers or suppliers. The intention to act only as an intermediary is usually expressed in the platform operator’s terms of service. Such statements can be found, for example, in the terms and conditions of Uber and Airbnb. It is doubtful, however, whether such a declaration is sufficient for reducing the role of the platform to an intermediary. […] the limitation of the platform operator’s role to a mere intermediary function does not become part of the contract if it is not stated in a clear and comprehensible manner. As a result, the platform operator would be considered as the supplier of the goods or services” (BUSCH, Cristoph et al. The Rise of the Platform Economy, cit., p. 5).

[17] “Consumer contract law primarily deals with ‘bipolar’ contractual relationships between a trader and a consumer. If a trader and a consumer conclude their contract via an online platform such as Ebay or Airbnb, the platform is usually not party to this contract between the consumer and the supplier of the goods or services. In such a ‘triangular’ situation, however, there are also legal relationships between the platform and the consumer, as well as between the platform and the supplier. It is, at best, unclear whether these legal relationships with the platform, usually also contracts, fall into the scope of the current (or forthcoming) EU consumer law directives. If the supplier is not a business but a consumer, then EU consumer contract law certainly does not apply to such a consumer-to-consumer contract. As a result, many contracts, although concluded in the highly professional environment of an online platform, totally escape the scope of application of existing consumer contract law” (Ibid., p. 4).

[18] A diversidade de cenários é bem ilustrada por Guido SMORTO: “I rapporti tra fornitore diretto del servizio e beneficiario finale nella platform economy possono assumere diverse declinazioni. Quando colui che fornisce direttamente il servizio sia un lavoratore dependente della piattaforma, la piattaforma è direttamente responsabile nei confronti dei consumatori per l’inadempimento o l’inesatto adempimento della prestazione e dei conseguenti danni. In casi del genere, la piattaforma è la controparte professionale dell’utente finale e il diritto dei consumatori è applicabile alla fornitura del servizio, in aggiunta alle normative di settore. Mentre la disciplina del lavoro subordinato si applica ai rapporti tra il lavoratore e la piattaforma. Nel caso in cui, invece, la piattaforma si limiti ad intermediare lo scambio tra agenti economici indipendenti, possono prodursi due scenari distinti. È possibile che il fornitore sia un professionista. In questo caso il diritto dei consumatori si applica al rapporto intercorrente tra il consumatore ed il fornitore professionale del servizio. Una conclusione del genere è coerente con l’esigenza di proteggere il consumatore di fronte al professionista ed impedisce inoltre una disparità di trattamento tra nuovi concorrenti e operatori storici, che risulterebbe del tutto ingiustificata alla luce della qualificazione come professionista di entrambe” (La tutela del contraente debole nella platform economy, cit., pp. 436-437).

[19] Por todos, cf. BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, pp. 112-113.

[20] “Quando il fornitore non è un professionista non trovano applicazione né il diritto dei consumatori né la disciplina di settore, e l’utente finale può solamente invocare gli ordinari rimedi civilistici di diritto comune. Nonostante si sia affermato da più parti che l’esclusiva applicazione di soli rimedi ex post ai rapporti peer-to-peer sia la scelta migliore poiché favorisce l’innovazione, questo spostamento da una tutela fondata sul soddisfacimento di requisiti ex ante, tipica dei servizi offerti da operatori professionali, ad un sistema che fa affidamento pressoché esclusivo su rimedi a posteriori non è sempre consigliabile” (SMORTO, Guido. La tutela del contraente debole, cit., p. 437).

[21] “Nos modelos tradicionais de negócios (B2C), de um dos lados estava sempre um profissional. Assim, a qualificação da relação como relação de consumo dependia apenas de saber se do outro lado se encontrava alguém com as restantes características de um consumidor ou, pelo contrário, outro profissional. […] Na sharing economy, este paradigma sofreu alterações. A maior parte das transações são peer-to-peer (P2P), o que significa que, muitas vezes, o vendedor ou prestador de serviços não é profissional. Nestes casos, falha o preenchimento do elemento relacional, […] e, consequentemente, à não aplicação da legislação de consumo. Em traços gerais, podemos, pois, afirmar que as normas que regulam os contratos da sharing economy são também as normas do direito do consumo se a parte for consumidora, o que inclui verificar que a contraparte é um profissional, ou apenas as normas do regime geral (constantes designadamente do Código Civil), no caso contrário” (CARVALHO, Joana Campos. A proteção dos consumidores na sharing economy, cit., p. 304).

[22] Por exemplo, Guido SMORTO afirma que “Rispetto ai prestatori di servizi, invece, in molti casi costoro non hanno accesso a informazioni decisive relative allo scambio, non sono in grado di stabilire il prezzo della prestazione e/o valutare in anticipo la profittabilità di una determinata proposta, essendo costretti ad accettare qualsiasi richiesta indipendentemente dalla propria volontà. Una pratica, questa, che può essere particolarmente problematica quando la piattaforma mantenga prezzi bassi per ragioni competitive. […] Un altro aspetto fondamentale per stabilire il potere contrattuale degli utenti rispetto alla piattaforma riguarda la ridotta capacità di negoziare e influenzare il contenuto delle regole dello scambio. Le piattaforme normalmente impongono le proprie condizioni di contratto senza che vi sia spazio per una negoziazione. In alcuni rari casi un professionista può anche avere la forza contrattuale per negoziare con la piattaforma le condizioni della propria partecipazione al “mercato”, ma nella stragrande maggioranza delle volte non si tratta di un’opzione realistica. Spesso il contenuto dei contratti non è neppure realmente noto a chi li sottoscrive: la parte aderente tipicamente dichiara di averli letti cliccando una semplice icona di consenso sul proprio computer, secondo un comportamento che accomuna consumatori e fornitori” (SMORTO, Guido. La tutela del contraente debole nella platform economy, cit., pp. 428-429).

[23] A respeito da experiência europeia, já se ponderou que: “The supplier usually has to accept terms of use in which the platform operator tries to exclude its liability as far as possible. Against this background, it is an open question whether an EU legislative instrument should limit itself to the consumer protection aspects of online platforms, or take a more holistic approach by regulating also the rights and obligations of platforms towards suppliers. In particular, if suppliers are consumers, one might ask whether EU consumer law should also protect these ‘prosumers’ against platform operators” (BUSCH, Cristoph et al. The Rise of the Platform Economy, cit., p. 7).

[24] ZANATTA, R. Economias do compartilhamento: superando um problema conceitual. In: ZANATTA, R.; PAULA, P.; KIRA, B. (Org.). Economias do compartilhamento e o Direito. Curitiba: Juruá, 2017, pp. 79-106.

[25] ROCHET, J. C.; TIROLE, J. Platform Competition in Two-Sided Markets. Journal of the European Economic Association, v. 1, 4, jun. 2003, p. 991.

[26] EVANS, D. S. The Antitrust Economics of Two-Sided Markets. AEI-Brookings Joint Center for Regulatory Studies. set. 2002. p. 32. No original: “A market has network effects (also known as network externalities or positive-feedback effects) when consumers value a product more the more other consumers use that product”.

[27] Anthony Giddens define a confiança como “a crença na credibilidade de um indivíduo ou de um sistema baseado em resultados ou eventos, em que essa crença expressa uma fé na probidade ou amor de um outro, ou na correção de princípios abstratos (conhecimento técnico)”. (GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Editora UNESP, 1991, p. 36).

[28] SCHWARTZ, Fabio. A economia compartilhada e o novo conceito de fornecedor fiduciário nas relações de consumo. Rio de Janeiro: Processo, 2020, p. 133.

[29] SCHWARTZ, Fabio. Hiperconsumo & Hiperinovação: Combinação que desafia a qualidade da produção. Curitiba: Juruá Editora, 2016, p. 76.

[30] DIRKS, Kurt T.; FERRIN, Donald L. The role of trust in organizational settings. Organization Science.  v. 12, n. 4. jul./aug. 2001, pp. 450-467. Disponível em: [https://doi.org/10.1287/orsc.12.4.450.10640]. Acesso em: 13.06.2020.

[31] CARVALHO, Vinicius Marques de.; MATTIUZZO, Marcela. Confiança, reputação e redes: uma nova lógica econômica? In: ZANATTA, R.; DE PAULA, P.; KIRA, B. (Orgs.). Economias do Compartilhamento e o Direito. Curitiba: Juruá, 2017, pp. 41-58, p. 50.

[32] SOUZA, Carlos Affonso de. LEMOS, Ronaldo. Aspectos jurídicos da economia do compartilhamento: função social e tutela da confiança. Revista de Direito da Cidade, vol. 8, n. 4, 2016, p. 1760.

[33] CARVALHO, Vinicius Marques de.; MATTIUZZO, Marcela. Confiança, reputação e redes: uma nova lógica econômica? In: ZANATTA, R.; DE PAULA, P.; KIRA, B. (Orgs.). Economias do Compartilhamento e o Direito. Curitiba: Juruá, 2017, pp. 41-58.

[34] ZANATTA, Rafael. DE PAULA, Pedro. KIRA, Beatriz. Inovações regulatórias no transporte individual: o que há de novo nas megacidades após o uber? In: ZANATTA, R.; DE PAULA, P.; KIRA, B. (Orgs.). Economias do Compartilhamento e o Direito. Curitiba: Juruá, 2017, p. 139.

[35] EKMEKCI, Mehmet. Sustainable reputations with rating systems. Journal od Economic Theory. v. 146.
n. 2. 2011, pp. 479-503.

[36] Em pesquisa realizada pela Deloitte, em 2015 sobre comportamento de consumidores no planejamento de suas férias, que ouviu aproximadamente 40 mil entrevistados, conclui-se que 42% dos consumidores utilizam websites de recomendação e 59% indicaram que tais websites exerceria maior poder na tomada de decisão, influenciando na escolha de contratar. (DELOITTE LLP. Travel consumer 2015: engaging the empowered holidaymaker. 2015. Disponível em: [chrome-extension://oemmndcbldboiebfnladdacbdfmadadm/https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/uk/D ocuments/consumer-business/deloitte-uk-travel-consumer-2015.pdf]. Acesso em: 13.06.2020)

[37] SCHWARTZ, Fabio. A economia compartilhada e o novo conceito de fornecedor fiduciário nas relações de consumo. Rio de Janeiro: Processo, 2020, p. 148. Nesse sentido, veja-se, também, BA, Sulin; PAVLOU, Paul A. Evidence of the effect of trust building technology in electronic markets. MIS Quartely, pp 243-268.

[38] “What’s the secret? Who knew so many people would rent out rooms in their homes to strangers and that so many strangers would want to stay in other people’s spare bedrooms? The short answer is that Airbnb understood that the world was becoming hyperconnected – meaning the technology was there to connect any renter to any tourist or businessperson anywhere on the planet. And if someone created the trust platform to bring them together, huge value could be created for both parties. That was Airbnb’s real innovation – a platform of “trust” – where everyone could not only see everyone else’s identity but also rate them as good, bad or indifferent hosts or guests. This meant everyone using the system would pretty quickly develop a relevant “reputation” visible to everyone else in the system.” (FRIEDMAN, Thomas L. And now for a bit of good news. New York Times. Disponível em:[https://www.nytimes.com/2014/07/20/opinion/sunday/thomas-l-friedman-and-now-for-a-bit-of-good-news.html]. Acesso em: 13.06.2020.

[39] SOUZA, Carlos Affonso de. LEMOS, Ronaldo. Aspectos jurídicos da economia do compartilhamento: função social e tutela da confiança. Revista de Direito da Cidade, vol. 8, n. 4, 2016, pp. 1771-1773.

[40] É comum ouvir relatos de motoristas de aplicativos que, por exemplo, recusam corridas para usuários que possuem avaliação menor que 4 estrelas e meia, pois a experiência ou comentários de outros motoristas revelam que tais passageiros são barulhentos, mal-educados ou até mesmo já promoveram episódios de lesão ou prejuízo à higiene e conservação do veículo.

[41] Destaca-se, brevemente, os filmes que marcaram época como “A.I. Artificial Intelligence” (Steven Spilberg), “I, Robot” (Isaac Asimov) e “O Exterminador do Futuro” (James Cameron).

[42] TURING, Alan M. (1950). Computing machinery and intelligence. Mind 59 (October). pp. 433-460. Disponível em: [https://philpapers.org/rec/TURCMA]. Acesso em: 13.06.2020.

[43] KURZWEIL, Ray. The Age of Intelligent Machines. Cambridge: Mit Press, 1990.

[44] BARR, Avron. FEIGENBAUM, Edward A. The Handbook of artificial intelligence. v. 1. Front Cover: Addison-Wesley. 1986.

[45] ROCHA, Leonel Severo. TACCA, Adriano. Inteligência artificial: reflexos no sistema do direito. Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFC. v. 38.2, jul./dez. 2018, pp. 53-68, p.59.

[46] SURDEN, H. Machine Learning and Law. Washington Law Review. v. 89, 2014, p. 89. Ainda, MATTHIAS, Andreas. The responsibility gap: ascribing responsibility for the actions of learning automata. Ethics and Information Technology, v. 6, issue 3, set. 2004. item 2.

[47] ROCHA, Leonel Severo. TACCA, Adriano. Inteligência artificial, cit., p. 60.

[48] MENDES, Laura Schertel. DONEDA, Danilo. SOUZA, Carlos Affonso Pereira; ANDRADE, Norberto Nuno Gomes de. Considerações iniciais sobre inteligência artificial, ética e autonomia pessoal. Pensar – Revista De Ciências Jurídicas. v. 23, p. 1-17, 2018, p. 4.

[49] Reportagem disponível em: [https://www.acritica.com/channels/manaus/news/app-de-transporte-investe-em-inteligencia-artificial-para-maior-seguranca-dos-passageiros]. Acesso em: 14.06.2020.

[50] “Conquanto passem a atuar sem o aval e, muitas vezes, sem o conhecimento de seus programadores, as ações praticadas pela IA, por óbvio, acarretam repercussões jurídicas e, portanto, demandam soluções de forma premente. Sobretudo no âmbito da Internet, a IA já está presente nos provedores de aplicação de comércio eletrônico, de redes sociais e das principais plataformas de busca e de compartilhamento de dados” (PIRES, Thatiane Cristina Fontão; SILVA, Rafael Peteffi da. A responsabilidade civil pelos atos autônomos da inteligência artificial: notas iniciais sobre a resolução do Parlamento Europeu. Revista Brasileira de Políticas Públicas, v. 7, n. 3, dez. 2017. p. 240).

[51] GABRIEL, Anderson de Paiva. TEFFÉ, Chiara Spadaccini de. Ferramentas tecnológicas e controle da pandemia. JOTA. Disponível em: [https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/juiz-hermes/ferramentas-tecnologicas-e-controle-da-pandemia-14062020]. Acesso em: 14.06.2020. Ainda nesse sentido, vide SCHNEIER, Bruce. Data and Goliath: The Hidden Battles to Collect Your Data and Control Your World. Nova Iorque: W. W. Norton & Company, 2016.

[52] HOFFMANN-RIEM, Wolfgang. Inteligência Artificial Como Oportunidade para a Regulação Jurídica. RDU, Porto Alegre, Volume 16, n. 90, 2019, 11-38, nov-dez 2019, p. 13.

[53] Nesse sentido, vale destacar que O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em decisão histórica, no âmbito de cinco ações diretas de inconstitucionalidade (ADI nº 6.387, ADI nº 6.388, ADI nº 6.389, ADI nº 6.390 e ADI nº 6393), suspendeu a eficácia da MP nº 954/2020, que prevê o compartilhamento de dados de usuários de telefônicas com o IBGE, para a produção de estatística oficial durante a pandemia do Covid-19. “(…) Significa dizer que a proteção de dados pessoais se constitui, em si mesma, em princípio autônomo, capaz de deflagrar o controle de constitucionalidade. Com tal decisão, reafirma-se no direito brasileiro a urgência na entrada em vigor da Lei nº 13.709/18 (Lei Geral de Proteção de Dados), que proteja a privacidade dos indivíduos, evitando captura, compartilhamentos e transferências desproporcionais de informações por parte do Poder Público e das empresas privadas.” (TEPEDINO, Gustavo. Editorial da Revista Brasileira de Direito Civil. Revista Brasileira de Direito Civil. v. 24, n. 02, 2020. Disponível em:[https://rbdcivil.ibdcivil.org.br/rbdc/article/view/587/358]. Acesso em: 14.06.2020.)

[54] GABRIEL, Anderson de Paiva. TEFFÉ, Chiara Spadaccini de. Ferramentas tecnológicas e controle da pandemia. JOTA. Disponível em: [https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/juiz-hermes/ferramentas-tecnologicas-e-controle-da-pandemia-14062020]. Acesso em: 14.06.2020.

[55] HOFFMANN-RIEM, Wolfgang. Inteligência Artificial Como Oportunidade para a Regulação Jurídica, cit., p. 29.

[56] Acerca do regime e implicações de responsabilidade civil pelo uso da Inteligência artificial, veja-se, por todos, TEPEDINO, Gustavo; SILVA, Rodrigo da Guia. Desafios da inteligência artificial em matéria de responsabilidade civil. Revista Brasileira de Direito Civil – RBDCivil, Belo Horizonte, v. 21, p. 61-86, jul./set. 2019. Disponível em: [https://rbdcivil.ibdcivil.org.br/rbdc/article/view/465]. Acesso em: 14.06. 2020.

[57] A progressiva perda de importância do modelo proprietário, a rigor, consiste em uma tendência, ao menos, tão antiga quanto o debate acerca dos bens comuns. A respeito, cf., na doutrina italiana, RODOTÀ, Stefano. Mondo delle persone, mondo dei beni. Il diritto di avere diritti. Roma: Laterza, 2015.[:]

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