Limitação a pedido de vista tem efeito incerto

DCI

Guilherme Rizzo Amaral

 

A partir de 2016, os magistrados terão no máximo 20 dias para estudar melhor um caso depois de solicitar vista. A expectativa de especialistas ouvidos pelo DCI é que o STF não obedeça a norma

São Paulo – Apesar de o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ter limitado a 20 dias os pedidos de vista – um recurso que dá ao juiz mais tempo para analisar um caso – ainda existem dúvidas sobre como a regra será de fato aplicada nos tribunais.

Numa primeira leitura, a comunidade jurídica avalia que a decisão pode garantir mais celeridade ao Judiciário. “Pode-se ver essa resolução com bons olhos. É um sinal aos tribunais de que esses pedidos de vista que às vezes parecem mais pedidos a perder de vista não podem prevalecer”, afirma o sócio do Bichara Advogados, Francisco Carlos Rosas Giardina.

Ele conta que em muitas situações os processos ficavam travados por anos em razão de pedido de vista. “Há ainda uma questão de imprevisibilidade. De uma hora para outra, um caso que estava há anos parado era pautado para julgamento”, afirma.

Agora, quando o colegiado de um tribunal estadual ou federal descumprir o prazo, Giardina conta que é possível fazer um pedido de providências ao próprio CNJ. Com isso, o tribunal seria obrigado a julgar a questão. As cortes têm 120 dias, ou seja, até 27 de fevereiro de 2016 para adaptar seus regimentos à resolução.

De todo modo, ele destaca que há incerteza sobre a aplicação da norma. “Precisaremos ver como isso vai acontecer na prática. Não se sabe até que ponto as cortes vão cumprir a medida”, afirma ele.

Se nos tribunais comuns já existem dúvidas sobre a aplicação da norma, no Supremo Tribunal Federal (STF) a expectativa é de que a limitação do pedido de vista não tenha qualquer efeito prático.

Apesar de o STF não estar subordinado à regulamentação do CNJ, o sócio do Souto Correa Advogados, Guilherme Rizzo Amaral, afirma que o tribunal precisará se adequar ao novo Código de Processo Civil (CPC), que traz em seu artigo 940 uma regra idêntica sobre o prazo do pedido de vista.

“Mas imagino que essa regra do 940 será temperada no âmbito do STF. Tenho a impressão de que haverá uma tolerância maior sobre o descumprimento do prazo”, afirma Amaral.

Poder de veto

Apesar de entender que qualquer passo no sentido de resolver o problema dos pedidos de vista é positivo, o professor da FGV Direito Rio, Ivar Hartmann, diz que os resultados práticos da resolução são limitados. “O grande problema dos pedidos vista está no STF”, diz.

No passado o Supremo chegou a elaborar resolução para limitar as vistas, mas as regras não foram cumpridas, observa o professor. “Se os ministros não cumprem nem as obrigações do próprio regimento, que eles mesmos alteram, por que aceitariam obrigação vinda de outro poder? Não acho que cumprirão [as novas regras]”, argumenta ele.

Hartmann, um dos coordenadores do estudo Supremo em Números, afirma que a análise estatística dos julgamentos do STF mostra que a maioria dos pedidos de vista não tem relação com a justificativa de que o ministro precisa de tempo para estudar melhor o caso. Para ele, os pedidos de vista estão mais relacionados à tentativa de controlar os processos.

“É uma questão de poder”, destaca o professor. Como o pedido de vista de apenas um ministro pode travar um caso no Supremo por tempo indeterminado, ele compara a possibilidade ao poder de veto presidencial. “É um poder desproporcional. Nós estudamos tribunais de outros países, mas não encontramos situações similares. Tampouco acreditamos que esse poder [de pedir vista] seja benéfico à sociedade”, afirma o Hartmann.

Roberto Dumke

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