A tributação no marketplace digital

Giácomo Paro
JOTA
03/06/2018

Não são raras as discussões travadas acerca do papel das empresas detentoras dos marketplaces digitais
Uma rápida análise em sites diversos acerca dos aplicativos mais baixados revela que aqueles destinados a aproximar compradores e vendedores figuram em todas as listas.
Os chamados marketplaces digitais surgem como uma ferramenta onde todas as partes são beneficiadas. Os compradores são expostos a uma rede de possibilidades, tendo acesso a diferentes fornecedores, sem que precisem desenvolver profundas pesquisas para isso, enquanto os vendedores são expostos a um grande número de potenciais clientes, sem que, para isso, precisem investir altos valores em propaganda ou espaços físicos.
Não há dúvida, portanto, que os marketplaces digitais, à medida que expandem suas redes de usuários (vendedores e compradores) tendem a impulsionar os números verificados nos setores econômicos nos quais suas plataformas estão inseridas.
Os marketplaces digitais proporcionam assim o ganho de escala para aqueles que ofertam produtos e agregam à relação entre o consumidor e o fornecedor o elemento confiança, o que, sem dúvida, estimula o consumo.
Isso é facilmente observado no dia a dia com os aplicativos que conectam motoristas a passageiros, restaurantes a clientes, compradores de mercadorias a marcas, hotéis a turistas, entre outros.
O crescimento, no entanto, vem, em regra, acompanhado por maior atenção por parte autoridades fiscais acerca das práticas adotadas pelas empresas detentoras dos marketplaces no que se refere ao recolhimento dos tributos.
Na mesma linha, a inovação que caracteriza os marketplaces digitais, ingressando cada vez mais em diferentes setores da economia, serve também como um elemento que acaba por dificultar o entendimento por parte do aplicador do direito, aqui mais especificamente do direito tributário, acerca do correto enquadramento daquela atividade nas normas existentes.
Como resultado disso, não são raras as discussões travadas acerca do papel desempenhado pelas empresas detentoras dos marketplaces digitais, sendo esse um fator fundamental para a definição de qual a receita a ser reconhecida por essas empresas e qual o tratamento tributário a elas dispensado.
As empresas que detém os marketplaces digitais são prestadores de serviços de intermediação. Ou seja, não importa o que seja transacionado por meio da plataforma (livros, carros, roupas, serviços, comida, etc.); a empresa detentora da plataforma estará sempre figurando na posição de agenciadora de compradores e vendedores.
Não há que se falar, assim, que a empresa detentora do marketplace seria uma prestadora de serviços de transporte, ou um restaurante, ou uma revendedora de produtos ou prestadora de serviços de hospedagem, diferente do que ocorre, por exemplo, com as empresas de e-commerce.
Somente a partir dessa compreensão é possível entender que essas empresas reconhecem em seus resultados tão somente a receita relacionada ao serviço de intermediação realizado (o chamado take rate). Nem poderia ser diferente, afinal somente esse valor representa a contrapartida a um serviço prestado e, portanto, um benefício econômico incorporado ao patrimônio da empresa. Os demais valores apenas transitam por contas de ativo e passivo, na medida em que correspondem a meros ingressos.
Em geral, o take rate é cobrado apenas dos vendedores dos produtos ou serviços oferecidos na plataforma, não havendo cobrança seja pelo download do aplicativo seja pela intermediação realizada em benefício do consumidor dessas mercadorias ou serviços.
É bem verdade que, sob o ponto de vista de análise financeira, o total de transações realizadas dentro do marketplace (o chamado GMV) seja talvez o elemento de maior relevância, mas isso, repita-se, aparece apenas nas contas de ativo e passivo das empresas (e não na demonstração de resultados).
Entendido esse contexto, fica fácil perceber que as empresas detentoras dos marketplaces submetem à tributação pela Contribuição ao Programa de Integração Social (PIS), Contribuição ao Financiamento da Seguridade Social (COFINS), Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)[1] tão somente os valores cobrados a título de take rate e não, como se pode pensar, a totalidade do valor transacionado na plataforma.
Ainda nessa linha, importante perceber que, na qualidade de prestadoras de serviços, não há dúvida que essas empresas podem calcular créditos de PIS e COFINS em relação às despesas com bens e serviços utilizados como insumo na realização desse serviço. Em outras palavras, não se aplica a essas empresas a discussão acerca da impossibilidade de apuração de créditos de PIS e COFINS sobre insumos na atividade de revenda.
Por fim, por se tratarem de prestadoras de serviços de intermediação, tais empresas estão sujeitas ao recolhimento do Imposto sobre Serviços (ISS), que tem como base de cálculo, novamente, o take rate cobrado.
Evidente que as discussões não param por aqui. O Município para o qual deve ser recolhido o ISS e quais os bens e serviço considerados insumos para fins de creditamento de PIS e COFINS são exemplos de debates que são travados de maneira recorrente no contexto do marketplace digital.
De qualquer forma, a exata compreensão do negócio desenvolvido e, assim, das noções básicas acerca da receita tributável servem como um bom ponto de partida para que esses debates mais complexos possam ser travados com os argumentos corretos.

——————————-

[1] Conforme determinam os artigos 1º da Lei nº 10.833/2003 e Lei nº 10.637/2002, artigos 6º e 12 Do Decreto Lei nº 1.598/77, artigos 2º e 3º da Lei nº 9.718/98.

Sou assinante
Sou assinante