Reforma trabalhista: aprendemos algo?

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João Marimon
Estadão
18/12/19

A reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) trouxe a regulamentação do trabalho intermitente, forma de contratação responsável por boa parte das vagas de emprego criadas em 2018. A modalidade se caracteriza pela prestação de serviços mediante convocações, mesclando períodos de atividade e inatividade, sem jornada ou carga horária específica e predeterminada, sendo o trabalhador remunerado pelas horas efetivamente trabalhadas, ao final de cada convocação, observados parâmetros mínimos de valor/hora.

Trata-se, em suma, da formalização de situação que sempre existiu, garantindo direitos a quem antes trabalhava informalmente por meio de “bicos”, comum em hotéis, lojas, bares e restaurantes.

No último mês, contudo, o Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais deu indícios de que, mais uma vez, a observância da legislação pela Justiça do Trabalho se dará de forma conturbada, ou, no caso, não se dará.

Na decisão, o Tribunal condenou uma rede varejista a registrar funcionário contratado como intermitente como se empregado de tempo integral fosse, determinando o pagamento de salários mensais e todas as contribuições incidentes, ainda que a prestação de serviços tenha ocorrido em apenas dois dias ao longo de cerca de três meses de contrato.

A condenação foi fundamentada no entendimento de que a contratação na modalidade intermitente pode ocorrer apenas para vagas de “caráter excepcional”, e não para atividades “típicas, permanentes e contínuas da empresa”.

Essa limitação não está prevista em lei.

Aliás, a leitura da norma permite a verificação exatamente do contrário. A CLT garante que o valor da hora de trabalho do empregado intermitente não poderá ser inferior ao valor/hora do salário mínimo ou “àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não”.

Ou seja, se é possível ter ao mesmo tempo trabalhadores com contrato intermitente e trabalhadores com contrato a prazo indeterminado na mesma função, há, portanto, autorização para contratação de intermitentes para quaisquer atividades, mesmo as típicas e contínuas de uma empresa.

Mesmo que não existisse autorização, a mera ausência de proibição é suficiente para que a decisão se configure ilegal, pois cria obrigação não prevista em lei, afrontando o princípio constitucional da legalidade, resumido na permissão para se fazer tudo aquilo que não é expressamente proibido.

A inovação trazida pelo Tribunal mineiro lembra a famosa distinção entre atividade-meio e atividade-fim para terceirização de atividades, também criada pela Justiça do Trabalho, que resultou em condenações trabalhistas por mais de vinte anos.

A questão foi resolvida apenas recentemente, quando o STF finalmente declarou inconstitucional a limitação criada pela Súmula n.º 331 do TST, exatamente pela ausência de respaldo legal e pela interferência de forma imotivada na liberdade de contratar.

Os principais responsáveis pela reforma trabalhista são os que mais a criticam, que por anos banalizaram a Justiça do Trabalho e a tornaram um campo de discussões e decisões ideológicas e não legais.

A reforma trabalhista visou coibir tal comportamento por parte dos julgadores, proibindo expressamente a edição de súmulas e enunciados restringindo direitos legalmente previstos ou criando obrigações não previstas em lei.

Ao que parece, contudo, a lição não foi aprendida. Ao deixar de ‘poder’ agir dessa forma em relação à terceirização, a Justiça do Trabalho se mostra disposta a novamente inventar limitações não previstas em lei e interferir de forma imotivada na liberdade de contratação, dessa vez do trabalhador intermitente.

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