Reforma trabalhista da crise

Denise Pires Fincato
Zero Hora
27/04/2017

 

O Brasil é prodigioso em produzir leis. Na área trabalhista, nosso cotidiano é tentar harmonizar normas, súmulas e orientações. A reforma trabalhista, proposta pelo governo Temer em dezembro passado, é a “reforma da crise”. Embora revele algum avanço, é imediatista e nem de longe atende ao que necessitamos em termos de modernização da legislação trabalhista brasileira, que é essencialmente a mesma desde 1943. E não podemos negar a mudança do trabalho desde então, especialmente em razão do avanço tecnológico.

O PL nº 6.787/2016 refere que países como Espanha, França e Portugal já fizeram suas reformas e os indica como seus paradigmas. A notícia é verdadeira. No entanto, é importante referir que mesmo esses países, que já estão anos-luz à nossa frente em termos de modernização de sua legislação trabalhista, também fizeram reformas para a crise, ou seja, revisaram a regulamentação do trabalho apenas nos momentos em que a crise econômica os estrangulou.

O mundo do trabalho carece de reformas normativas fundamentais e reestruturantes. Observando a realidade nacional, não modernizaremos nosso conjunto normativo com a proposta enviada pelo governo federal ao Congresso. Nem sequer a crise (fenômeno multifatorial, histórico e complexo) resolveremos com ela, pois isto exige olhar e atuação sistêmica, a começar pelo controle da corrupção e retomada, pelo Estado, de seus misteres essenciais, tais como segurança, educação e saúde.

Não podemos nos limitar à cópia do que fizeram outros países. Domenico de Masi, por exemplo, aponta de forma bastante fundamentada que o Brasil pode ser referência mundial no Direito do Trabalho. Para tanto, necessitaremos de uma reforma estrutural na legislação trabalhista, que repense nosso modelo sindical, valorize a negociação coletiva, regulamente a terceirização, normatize alternativas de remuneração do trabalho, entre outros temas tão necessários às novas formas de sua organização, que geram distintos ritmos, territórios e intensidades laborais.

Os pensadores devem estar à disposição para ajudar nesta reconstrução, desprovidos, no entanto, de impregnações ideológicas radicais (para qualquer lado e sentido), que apenas fazem cegar os analistas à percepção dos estágios evolutivos da humanidade em sua relação com o trabalho.

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