Responsabilidade ambiental: estamos fazendo o suficiente?

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Emília Klein Malacarne e Fabiana da Silva Figueiró
Estadão
10/02/2019

Episódios que resultam em grandes danos ambientais e humanos trazem consigo clamor por respostas imediatas. Quem será responsabilizado? Quem será preso? Quem pagará pelos danos gerados? Quando as vítimas serão indenizadas? Se as perguntas parecem simples, as respostas são complexas e demandam um árduo trabalho de investigação, que precisa levar em conta o sistema jurídico estabelecido.

Antes de responder a tais perguntas, é preciso ter em mente que a Constituição Federal de 1988 previu a tríplice responsabilidade em matéria ambiental, regulamentada pela Lei de Crimes Ambientais dez anos depois do marco constitucional.

Isso significa que há, no Brasil, três esferas de responsabilização em casos de danos ambientais: a civil, que gera o dever de indenizar frente ao dano causado ou de recuperar o meio ambiente degradado; a administrativa, em que há imposição de sanções pecuniárias consistentes, especialmente no pagamento de multas e no embargo de obras e atividades; além da penal, que visa à imposição de penas restritivas de direitos ou privativas de liberdade aos autores do fato, que podem ser pessoas físicas e empresas.

Essas três esferas são independentes e possuem requisitos distintos para responsabilização, mas se preenchidos todos os pressupostos, podem incidir simultaneamente sobre o responsável.

Quanto às hipóteses de responsabilização criminal, destacam-se duas premissas, sem as quais não poderá haver condenação.

A primeira delas é a necessidade de que o comportamento individual do acusado tenha dado causa ou contribuído para o resultado, seja por ação ou por omissão. Porém, não basta a existência de um nexo causal para a configuração de um crime.

Faz-se necessário, ainda, que essa conduta tenha sido praticada com dolo – que é a vontade livre e consciente voltada para a prática de um crime -, ou, ao menos, com culpa – que ocorre quando o indivíduo age sem observar o devido dever de cuidado (com negligência, imprudência ou imperícia). Sem isso, estaríamos admitindo a hipótese de responsabilização objetiva, o que só é possível na esfera civil.

A identificação desses elementos é mais difícil quando se trata de crimes praticados por omissão, muito comuns nos casos de crimes ambientais.

O Código Penal dispõe que a omissão penalmente relevante é somente aquela em que o omitente devia e podia agir para evitar o resultado.

Há, portanto, duas condições para a responsabilização por omissão: o dever e a possibilidade de agir. Esse dever de agir incumbe, por exemplo, a quem tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância.

Essa previsão do Código Penal deve ser lida em conjunto com a Lei de Crimes Ambientais, a qual amplia o leque de possibilidades de criminalização da omissão àquelas pessoas que, pelo mero fato de ocuparem a posição de diretor, administrador, membro de conselho e de órgão técnico, auditor, gerente, preposto ou mandatário de pessoa jurídica, têm o dever de agir para evitar o resultado sempre que tomarem conhecimento da prática de uma conduta criminosa no âmbito da sua empresa e puderem agir para evitá-la.

A rigidez dos requisitos para a responsabilização criminal se justifica na medida em que o Direito Penal afeta a esfera de liberdade das pessoas e deve ser acionado somente como último recurso. O que não significa que as pessoas ou as empresas envolvidas não poderão ser responsabilizados em outras searas.

Não há dúvidas de que respostas devem ser dadas de forma célere. Todavia, para viabilizar isso, o Estado deve, antes de tudo, individualizar adequadamente as condutas e observar com rigor as regras de atribuição de responsabilidades. Do contrário, sempre haverá o risco de se dar causa a mais injustiças ou, ainda, a nulidades que poderão colocar em xeque os atos já praticados, frustrando ainda mais a população.

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