Tarifa Branca: Alívio aos consumidores que não diminui a falta de investimentos no setor elétrico
Renata Misoczki
Canal Energia
09/10/2017
A nova modalidade tarifária permite que o consumidor escolha, de forma consciente, a melhor forma de utilizar a energia elétrica, podendo reduzir seus custos com a energia elétrica
Após tantas discussões sobre programas de eficiência energética e de pesquisa e desenvolvimento para esta finalidade, por vezes nos vemos em situação crítica à beira de um novo período de escassez de energia por falta de expansão dos sistemas de geração, transmissão e distribuição, bem como manutenção das redes de transmissão e distribuição de energia elétrica, que deveriam estar em consonância com programas de eficiência energética.
Dentre várias medidas adotadas, uma das formas de mitigação dos custos com a escassez hídrica foi a instituição, em 2015, do sistema de bandeiras tarifárias, que sinaliza aos consumidores os custos reais da geração de energia elétrica, que pode variar de acordo com a disponibilidade hidrológica do sistema, transferindo o custo do acionamento das usinas térmicas para os consumidores de forma mensal, aliviando os custos das distribuidoras com a compra de energia a custos elevados advinda das térmicas.
Nessa mesma linha está a tarifa branca, que permitirá que o consumidor escolha, caso opte pela adoção desse sistema, em qual horário do dia concentrará suas atividades, podendo assim pagar uma tarifa mais barata pelo uso da energia, além de aliviar o sistema elétrico como um todo nos horários de pico.
Essa alternativa vem sendo discutida no âmbito da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL desde 2010, sendo que em setembro/2016 foi publicada a Resolução Normativa nº 733/2016, que estabeleceu as condições para a aplicação da modalidade tarifária horária branca, a qual passa a vigorar a partir de janeiro/2018, conforme confirmado pela Agência Reguladora em 12.09.2017, por meio do Despacho nº 2907/2017.
Na primeira fase do cronograma de implantação dessa modalidade tarifária, ou seja, a partir de janeiro/2018, os consumidores que apresentarem consumo médio anual acima de 500 kWh/mês poderão optar pela tarifa branca, sendo que a demanda cai para média anual superior a 250/Kwh/mês em 2019, sendo facultada a todas as unidades consumidoras a partir de janeiro/2020.
A modalidade é destinada aos consumidores do Grupo B e àqueles do Grupo A (consumidores atendidos em alta tensão, acima de 2300 Volts) que possam optar pela tarifa do Grupo B de acordo com o disposto no art. 100 da Resolução Normativa nº 414/2010, não se aplicando às unidades consumidoras da classe “iluminação pública” ou àquelas com faturamento pela modalidade pré-pagamento.
Nessa modalidade tarifária os valores da energia variam de acordo com os dias e horários da semana, sendo que nos dias úteis, o valor tarifa branca varia em três horários: ponta, intermediário e fora de ponta. No horário de ponta e no intermediário, a energia é mais cara. No fora de ponta, é mais barata. Nos feriados nacionais e nos finais de semana, o valor a ser considerado é sempre o fora de ponta.
A Tarifa Branca reflete o uso da rede de distribuição de energia elétrica de acordo com o horário de consumo. Assim, quando o consumidor centraliza seu consumo no período fora de ponta, pode reduzir seus gastos com energia elétrica e, ao mesmo tempo, melhorar o fator de utilização das redes o que reduz ou posterga investimentos por parte do governo.
Para chegar aos consumidores, a energia elétrica percorre toda uma estrutura de redes (condutores e postes, entre outros). As redes têm períodos de utilização mais intensos e outros de menor uso ou até ociosos. Como a rede é dimensionada para atender a esses horários de ponta, o aumento do consumo de energia nesses períodos acarreta expansão da capacidade instalada, o que não se verifica quando o consumo ocorre fora da ponta.
Portanto, se o consumidor priorizar o consumo de energia no horário fora de ponta, a opção pela tarifa branca oferece a oportunidade de reduzir o valor pago pela energia consumida. É importante que o consumidor faça um estudo ou se submeta a um período de teste a fim de verificar se de fato obterá vantagem com essa modalidade tarifária antes de formalizar sua opção junto à distribuidora.
Ao optar pela Tarifa Branca, o consumidor deve ser disciplinado no gerenciamento de seu consumo, pois o horário de utilização da energia é fundamental para a economia na conta de luz. Caso não consiga evitar o consumo no horário de ponta, a adesão à Tarifa Branca pode resultar em uma conta maior: nessa situação, é mais vantajoso continuar na Tarifa Convencional.
Antes de optar pela Tarifa Branca, é preciso que o consumidor faça uma análise sobre o seu perfil de consumo e os hábitos de utilização da energia elétrica ao longo do dia, comparando-os com os períodos de ponta e intermediário definidos para a distribuidora que o atende.
Para os consumidores residenciais, os aparelhos elétricos que mais contribuem com o consumo de energia no período de ponta são o chuveiro elétrico e os equipamentos de condicionamento ambiental, tais como ar-condicionado e aquecedores. Por apresentarem um elevado consumo de energia em comparação com os demais equipamentos, a possibilidade de utilizá-los nos períodos de fora de ponta será fundamental para definir se a adesão à Tarifa Branca pode ser vantajosa para o consumidor.
Não obstante, caso o consumidor não se adapte ao sistema da tarifa branca, poderá retornar ao sistema convencional a qualquer tempo, devendo ser atendido pela distribuidora em até trinta dias. Nessa hipótese, uma nova adesão ao sistema da tarifa branca só será possível após o decurso de cento e oitenta dias.
A nova modalidade tarifária permite que o consumidor escolha, de forma consciente, a melhor forma de utilizar a energia elétrica, podendo reduzir seus custos com a energia elétrica.
Ao se promover esse formato de gerenciamento do uso da energia elétrica cria-se também uma oportunidade para o mercado reagir ao sinal de escassez e sobrecusto e, dessa forma, reduzir o consumo. Assim, conforme a intensidade dessa resposta, a necessidade do despacho das usinas térmicas poderá ser menor e, consequentemente, haverá diminuição das despesas para as distribuidoras de energia e consequentemente para os consumidores de forma geral.
No entanto, não se pode acreditar que apenas o uso racional da energia seja a solução do setor elétrico. Tampouco, há que se transferir ao consumidor os ônus e responsabilidades que seriam do poder público em realizar investimentos para incremento da matriz energética, visando inclusive à modicidade tarifária.
O uso das usinas térmicas se tornou rotina, sendo que as concessionárias aparentemente se acomodaram com a utilização deste sistema uma vez que não implica em perdas financeiras para a empresa, já que os custos são repassados aos consumidores.
O sistema da tarifa branca não tem como escopo a diminuição da tarifa convencional, ainda que em médio e longo prazo. Ele tão somente atribui ao consumidor a escolha por gastar mais ou menos do seu orçamento com a utilização deste serviço, essencial por natureza. O novo sistema pode gerar economia para o consumidor, e benefícios para rede, mas desde que o consumidor se prive do uso da energia em determinados horários.
Há de se ter cautela, assim, para que não haja descaracterização, por parte do poder público, da essencialidade do fornecimento de energia elétrica por meio de normas infra legais, impondo ao consumidor suportar o alto custo da energia, pela falta de investimentos.
Atualmente vivenciamos um cenário em que a energia elétrica, a custo mais reduzido, depende única e exclusivamente das chuvas, que mantém os reservatórios abastecidos, podendo se fazer uso das hidrelétricas, que ainda são a principal fonte geradora de energia elétrica no Brasil.
Assim, podemos dizer que os problemas estão longe de serem resolvidos, e não o serão, por meio de medidas que repassam ao consumidor os ônus não suportados pelo sistema. A Tarifa Branca pode somar benefícios ao setor, mas longe de ser a solução da falta de investimentos e comprometimento dos entes envolvidos em projetos de infraestrutura, especialmente incentivando novas fontes, especialmente a solar.