Com a pauta travada na Câmara, políticos aproveitam para fazer campanha
Flavio Sirangelo
Correio Braziliense
24/04/2018
Vice-presidente da Casa, Fábio Ramalho diz que falta de votações ocorre pela ausência de consenso e a desestruturação da base do governo.
Sem aprovar nada relevante em três meses de trabalho, parlamentares estão mesmo é com a cabeça nas eleições. Prova disso é que ontem uma medida provisória (MP) envolvendo a reforma trabalhista perdeu a validade e outras oito correm risco de caducar nas próximas semanas.
Sem que as matérias sejam aprovadas, a pauta do plenário fica trancada e os debates cessam até que as questões sejam resolvidas. Enquanto isso, candidatos à reeleição organizam suas estratégias para um pleito menor e com novas regras.
Com a base desarticulada por causa da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente Michel Temer enfrenta obstrução política do PT, PSol e PCdoB. Demistas acompanham o presidente da Casa, Rodrigo Maia (RJ), que também parece mais preocupado em viabilizar seu nome na corrida ao Planalto e, em último caso, continuar à frente da Câmara. Para o vice-presidente da Câmara, deputado Fábio Ramalho (MDB-MG), a dificuldade em votar ocorre principalmente pela falta de consenso e a desestruturação da base.
“A maioria das medidas provisórias não têm pontos comuns. De uns tempos pra cá, o governo desaprendeu a fazer alianças, desaprendeu a negociar. É necessário reaglutinar”, afirma Ramalho. A MP que caducou ontem regulamenta pontos da reforma trabalhista, como o serviço em local insalubre durante a gravidez, o trabalho autônomo e o intermitente, além da negociação da jornada. Ao perder efeito, a Medida Provisória número 808 cria a necessidade de uma reorganização do governo federal.
A opção seria preencher algumas lacunas com decretos presidenciais. Mas a assessoria de imprensa da Casa Civil afirmou que “essa possibilidade é estudada”, mas que nada foi definido até agora, pois será necessário fazer uma reunião ministerial. As decisões podem ser enviadas diretamente pelo Palácio do Planalto, onde há maior interesse em manter as reformas como bandeira do governo de Michel Temer. O Ministério da Fazenda não comentou.
Consultor da área trabalhista e juiz aposentado, o ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (TRT-RS), Flávio Sirângelo, acredita que deixar a MP caducar foi um grande erro. “E o pior é que se torna algo irremediável. As correções necessárias na reforma tributária não podem ser feitas nem por decreto nem por portaria do Ministério do Trabalho. Existe essa chance, mas não resolve o problema. Tinha que ser MP ou lei.”
Nesta semana, os deputados tentam entrar em acordo para votar a inclusão obrigatória de consumidores no cadastro de bons pagadores. Hoje, não há obrigatoriedade. O projeto de Lei (PL) torna obrigatória a participação dos consumidores do Cadastro Positivo, quase um “selo de bom pagador”, e será o destaque do plenário na última semana de abril. Nada vai adiante, porém, sem que as oito MPs (leia quadro) sejam acolhidas ou rejeitadas pelos parlamentares.
“Com esse panorama você consegue enxergar as dificuldades que se tem aqui. É normal que se trabalhe em ritmo mais lento em ano eleitoral, e, se você reparar, essa desaceleração ocorre desde o ano passado. Ninguém quer se indispor”, afirmou um técnico da Casa. A assessoria de imprensa afirmou que não faz avaliações sobre a produtividade da Câmara.
Segurança
Quando Temer assinou o decreto determinando a intervenção no Rio de Janeiro, o governo ficou de implementar 15 medidas de apoio que ainda não vingaram. Uma delas deve ser votada hoje — MP 809/17, que autoriza o Instituto Chico Mendes (ICMBio) a escolher, sem licitação, um banco público para gerir o fundo com os recursos da compensação ambiental. Também precisa ser analisada a proposta que estabelece mandato para o presidente e os diretores do Banco Central, cargos indicados pelo presidente da República.
O Congresso brasileiro é um dos mais caros do mundo. Segundo levantamento da ONG Contas Abertas, o funcionamento da Câmara e do Senado custa R$ 28 milhões por dia, mais de R$ 1 milhão por hora. O custo dos parlamentares também é exorbitante. Apenas na Câmara, é necessário investir mais de R$ 1 bilhão para bancar o trabalho dos 513 deputados com mandato.
Pauta travada
Veja os temas das MPs que precisam ser analisados pela Câmara antes de caducar,
nas próximas semanas:
• Facilitação do acesso do Instituto Chico Mendes (ICMBio) ao fundo da taxa de compensação ambiental;
• Melhoria dos incentivos ao setor da informática, previstos na Lei da Informática Nacional;
• Possibilidade de os idosos sacarem os recursos do PIS e do Programa de Formação do Patrimônio ao Servidor Público;
• Fim da vedação para que a Pré-Sal Petróleo possa atuar diretamente na comercialização de petróleo e gás natural;
• Transferência de R$ 2 bilhões da União para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para superar dificuldades financeiras emergenciais;
• Criação de cargos comissionados para compor os conselhos de supervisão dos Regimes de Recuperação Fiscal dos Estados e do DF;
• Texto sobre tabelas de salários, vencimentos aplicáveis aos servidores civis e militares;
• Autorização para que o Brasil doe recursos à Palestina para a restauração de uma basílica.