Fiscalização responsiva é um avanço na regulação do setor elétrico, dizem agentes
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Fabio Di Lallo
CanalEnergia
24/06/2019
Após 8 anos de discussão, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) concluiu a revisão nos procedimentos e critério de aplicação de penalidades aos agentes do setor elétrico. As novas práticas de fiscalização, baseadas nos conceitos de regulação responsiva da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), estão reunidas na Resolução Normativa n° 846, publicada em 11 de junho.
A avaliação geral dos especialistas ouvidos pela Agência CanalEnergia é que a norma representa um avanço importante na regulação do setor elétrico, se alinhando as melhores práticas internacionais. Com a mudança, espera-se uma Aneel mais ativa e orientadora, resultando em penalidades mais adequadas a infração cometida e gradual, evitando assim recursos intermináveis que muitas vezes desaguam em uma disputa judicial.
“A fiscalização visará, primordialmente, à educação e orientação dos agentes do setor de energia elétrica, à prevenção de condutas violadoras da lei, dos regulamentos e dos contratos e à descentralização de atividades complementares aos Estados”, diz o parágrafo segundo da norma, que substituiu a REN 63/2004.
O ex-diretor da Aneel e sócio da RegE Barros Correia Advisers, Tiago de Barros Correia, disse que a fiscalização responsiva está associada à análise de impacto regulatório, fundamentada em dois princípios: eficiência da gestão do recurso público e redução do fardo regulatório.
Com base nesses conceitos, a Aneel tende a investir em tecnologia para monitorar as práticas dos agentes, prover orientação sempre que as práticas estiverem em desacordo com as regras, aplicando penalidades gradativas aos agentes, sendo que a pena máxima é a cassação da outorga ou o impedimento do agente operar no mercado de energia.
Barros lembra que a discussão inicial objetivava reformar a REN 63/04, revendo tipificações de infrações e recalibrando a dosimetria das multas. “Isso depois caminhou em outra direção depois de uma experiência que a Aneel teve em 2014 na OCDE”, disse o agora consultor.
Antes, a prática da Aneel consistia em penalizar o agente pelo valor máximo das infrações, como forma de mudar o comportamento do agente pelo prejuízo financeiro, lembrou o presidente da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE), Alexei Marconi Vivan. “Retirar o dinheiro da concessão não traz benefício nenhum… Essa resolução me parece bastante produtiva no sentido de evitar penalidades e viabilizar outros tipos de penalidades que possam reverter em benefício para a concessão”, avaliou o advogado.
Uma mudança muito elogiada pelos especialistas ouvidos pela reportagem é que agora a penalidade não se dará sobre a receita total da companhia, mas sim por segmento de atuação. Por exemplo, se o agente atuar em geração e transmissão e for penalizado por um atraso de uma obra de subestação, a penalidade recai sobre a receita de transmissão, excluindo o negócio de geração. Com isso, espera-se uma redução dos valores apenados.
“Os agentes sabem que o maior prejuízo para quem infringe as regras é o dano ‘reputacional’, muito maior do que o dano pecuniário. A regulação por punição tem que ser justa e aqui me parece que ela caminha nesse sentido”, disse o advogado Rômulo Mariani, do escritório Baraldi|Mariani Advogados.
Para o advogado do escritório Girardi & Advogados Associados e presidente da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (Abren), Yuri Schmitke, a resolução é um grande avanço para se atingir a regulação responsiva. Ele destaca gradação da penalidade, conceito comum em direito administrativo.
A Aneel vai orientar o agente que não conhece a norma, para apenas num segundo momento advertir o agente. Quem conhece a norma, mas não tem condição de cumpri-la, receberá uma penalidade diferente do agente que é reincidente. Schmitke acredita que os agentes buscarão rever algumas decisões, caso a retroatividade favoreça a parte penalizada.
O advogado Fabio Di Lallo, do escritório Souto Correa, concorda com o presidente da Abren sobre a possibilidade de retroação de decisões em benefício do réu. “Trata-se de uma nova visão da Aneel, no sentido de melhorar a prática sancionatória, buscando resultados mais práticos e efetivos na prestação do serviço adequado, não é simplesmente punir o agente. A norma traz meios mais eficazes de controle”, disse Di Lallo.
A norma é discutida desde 2011. Haja vista a relevância do tema no setor de elétrico, a segunda fase da audiência pública aproveitou 312 das 899 contribuições recebidas. Ou seja, 35% foram aproveitadas na norma. A norma proposta no fechamento da audiência pública possui 8.492 palavras, perante 14.471 da minuta posta em discussão, mostrando a tentativa da Aneel de simplificar o texto para facilitar a compreensão do conteúdo. Os agentes terão seis meses para estudar o novo regulamento.
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