Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020

Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020

Foi publicada ontem, dia 22 de março de 2020, a Medida Provisória nº 927 (MP), que alterou a legislação trabalhista, criando alternativas temporárias para enfrentar o período de calamidade pública decorrente do COVID-19 (Decreto nº 6 de 20 de março de 2020).

A MP, assinada pelo Presidente Jair Bolsonaro, em conjunto com o Ministro da Economia, Paulo Guedes, tem aplicação imediata e valerá enquanto perdurar o estado de calamidade pública previsto no decreto legislativo (com efeitos até 31 de dezembro de 2020). Para fins trabalhistas, ficou estipulado que a MP constitui hipótese de força maior, conforme a previsão do artigo 501 da CLT.

Além disso, a MP convalida as medidas que já foram adotadas pelos empregadores nos últimos 30 dias e que não a contrariem.

Em síntese, novas possibilidades foram criadas e outras, já existentes, tiveram suas formalidades flexibilizadas:

A) Teletrabalho: A hipótese, que já era prevista pela CLT, sofreu alterações que facilitam e agilizam a sua implementação: (i.) O regime poderá ser adotado a critério do empregador, sem a anuência dos empregados, e ser aplicado a estagiários e aprendizes; (ii.) Não será necessário registro prévio no contrato de trabalho; (iii.) O empregado deverá ser notificado com antecedência mínima de quarenta e oito horas (por escrito ou por meio eletrônico); (iv.) As disposições sobre a responsabilidade pelo fornecimento dos equipamentos para prestação do trabalho e reembolsos de despesas deverão se previstas em contrato escrito firmado em até trinta dias; (v.) Caso o empregado necessite, o empregador poderá fornecer os equipamentos em comodato e pagar por serviços de infraestrutura, o que não se caracterizará como verba salarial; e (vi.) O tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em contratual.

B) Férias Individuais: (i.) O empregador poderá antecipar as férias dos empregados, a seu critério, mesmo antes de ter transcorrido o período aquisitivo, desde que (a) os comunique com antecedência de quarenta e oito horas, (b) não sejam gozadas em período inferior a cinco dias; (ii.) empregador e empregado poderão negociar férias futuras mediante acordo individual escrito; (iii.) os empregados que pertençam ao grupo de risco do novo Coronavírus terão prioridade no gozo de férias; (iv.) o empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas dos trabalhadores da área da saúde ou que desempenhem funções essenciais mediante comunicação por escrito; (v.) o pagamento do adicional de um terço de férias concedida neste período, poderá ser realizado até dezembro; (vi.) a opção pela venda de um terço das férias ficará sujeita à concordância do empregador, cujo pagamento poderá ser realizado até dezembro; e (vii.) O pagamento da remuneração das férias poderá ser realizado até o quinto dia útil do mês subsequente ao gozo das férias.

C) Férias Coletivas: (i.) O empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas aos empregados e deverá notifica-los com antecedência mínima de quarenta e oito horas; (ii.) ficam suspensos os limites estabelecidos pela CLT, que limitam o gozo das férias coletivas em, no máximo, dois períodos por ano e, pelo menos, por dez dias de descanso em cada um deles; e (iii.) Não será necessária comunicação ao Ministério de Economia nem aos Sindicatos.

D) Aproveitamento e Antecipação de Feriados: (i.) O empregador poderá antecipar o gozo de feriados não religiosos e deverá notificar o empregado com antecedência mínima de quarenta e oito horas; (ii.) Os feriados gozados poderão ser utilizados para compensação do saldo do banco de horas; e (iii.) O aproveitamento de feriados religiosos dependerá da anuência escrita do empregado.

E) Banco de Horas: O empregador poderá interromper as suas atividades e instituir banco de horas via acordo individual ou coletivo para compensação, que deverá ocorrer em até dezoito meses após o fim do estado de calamidade.

F) Suspensão de Exigências Administrativas de Segurança e Medicina no Trabalho: Fica suspensa, durante o estado de calamidade, a obrigatoriedade de realização de: (i.) Exames médicos ocupacionais, exceto (a) os demissionais nos casos em que o periódico tenha sido realizado há mais de cento e oitenta dias da demissão; e (b) em casos específicos indicados pelo médico coordenador do programa de saúde ocupacional; (ii.) Treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho. Além disso, (iii.) As CIPAs poderão ser mantidas o os processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.

G) Afastamento para Qualificação: Os contratos de trabalho poderão ser suspensos por até quatro meses para qualificação profissional, não presencial, oferecida diretamente pelo empregador ou por meio de terceiros, com duração equivalente ao período de suspensão. Essa opção (i.) não dependerá de acordo ou convenção coletiva; (ii.) poderá ser acordada individualmente com o empregado ou grupo de empregados; (iii.) deverá ser registrada na CTPS. Em decorrência da suspensão, o pagamento de salários e benefícios ficará suspenso, cabendo às partes acordar eventual compensação pecuniária e concessão de benefícios, ambos sem natureza salarial. Por outro lado, não haverá concessão da bolsa de qualificação profissional, comumente fornecida pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). No início da tarde de 23 de março, o Presidente Jair Bolsonaro sinalizou em suas redes sociais que revogará esse trecho da MP, de forma que poderá haver mudanças em relação ao programa de qualificação profissional nos próximos dias.

H) Adiamento do Recolhimento de FGTS: (i.) A exigibilidade do recolhimento do FGTS ficará suspensa nos meses de março, abril e maio de 2020. Tais verbas poderão ser adimplidas, sem incidência de atualização, multa e encargos, em até seis parcelas mensais a partir de julho do mesmo ano; (ii.) Fica suspensa a contagem do prazo prescricional dos débitos relativos à contribuição do FGTS pelo prazo de cento e vinte dias; (iii.) Os prazos dos certificados de regularidade emitidos anteriormente à data de entrada em vigor da MP serão prorrogados por noventa dias; (iv.) Os parcelamentos de débito do FGTS em curso que tenham parcelas a vencer nos meses de março, abril e maio não impedirão a emissão de certificado de regularidade; e (v.) Os prazos processuais administrativos relacionados aos autos de infração por débito de FGTS ficarão suspensos por cento e oitenta dias contados da publicação da MP.

I) Horas Extras: Os estabelecimentos de saúde poderão prorrogar a jornada de trabalho e remunerar as horas excedentes no valor das normais, mediante acordo individual escrito, mesmo para as atividades insalubres e para a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis horas de descanso: (i.) possibilidade de prorrogação da jornada de trabalho e de remunerar as horas excedentes no valor das normais; e (ii.) possibilidade de adoção de escalas suplementares entre a décima terceira e a vigésima quarta hora do intervalo interjornada, garantido o repouso semanal remunerado. As horas mencionadas em ambos os itens acima poderão ser compensadas no prazo de dezoito meses após o fim do estado de calamidade.

J) Prorrogação de Acordos e Convenções Coletivas: Os instrumentos coletivos que vencerem no prazo de cento e oitenta dias da publicação na MP poderão ser prorrogados, à critério do empregador, pelo prazo de noventa dias.

K) Abono Anual: O pagamento do abono anual, garantido ao segurado e ao dependente da Previdência Social que, durante o ano, recebeu auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão, será antecipado. Assim, cinquenta por cento deverá ser pago em abril de 2020 e o restante em maio do mesmo ano.

Por fim, a MP definiu que os casos de Coronavírus não serão considerados como doença ocupacional, exceto mediante comprovação de nexo causal.

Além disso, a Medida determina que os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuem de maneira orientadora, ressalvadas as hipóteses graves como (i.) falta de registro de empregados (a partir de denúncias); (ii.) iminente risco aos empregados e irregularidades imediatamente relacionadas à tais; (iii.) acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à tal; e (iv.) regime de trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.

Este material não pretende esgotar a análise do tema, mas destacar os principais aspectos da MP. Trata-se de texto meramente informativo, não devendo ser considerado como opinião legal ou consulta jurídica.

É vedada a reprodução ou divulgação do conteúdo, parcial ou integralmente, sem a prévia referência à autoria (Souto Correa Advogados).

A MP está disponível aqui.

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