16.03.2015 – Reestruturação e Insolvência
Procuradoria-Geral da Fazenda regulamenta o parcelamento de débito fiscal para empresas em recuperação judicial
A Lei 13.043/2014, ao acrescentar o art. 10-A à Lei 10.522/2002, passou a permitir ao empresário individual ou à sociedade empresária que postular ou tiver deferido o processamento da recuperação judicial o parcelamento de seus débitos para com a Fazenda Nacional em até 84 parcelas mensais e consecutivas, observando-se determinados critérios e desde que o devedor desista de qualquer questionamento, judicial ou administrativo, referente aos débitos – exigência esta que, para muitos, é inconstitucional. Em 18/02/2015 foi publicado no Diário Oficial da União a Portaria Conjunta da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional/Receita Federal do Brasil nº 1, datada de 13/02/2015, que alterou a Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 15/2009 e regulamentou o parcelamento de débitos fiscais para empresas em recuperação judicial.
A alteração é relevante já que o art. 57 da Lei de Recuperação de Empresas e Falência (Lei 11.101/2005) exige a apresentação, pelo devedor em recuperação judicial, das certidões negativas de débitos tributários para que seja concedida a recuperação judicial. Esta exigência vinha sendo dispensada pela jurisprudência diante da inexistência de regras sobre o parcelamento de débito fiscal para devedores em recuperação judicial, conforme previsto no art. 155-A do Código Tributário Nacional e no art. 68 da Lei 11.101/2005.
Diante da modificação promovida pela Lei 13.043/2014 e da sua regulamentação pela PGFN/RFB, o parcelamento dos débitos e a necessidade de obtenção das certidões negativas voltarão a ser questões relevantes para os empresários individuais e sociedades empresárias que pretendam se valer da recuperação judicial – inclusive porque a referida Portaria PGFN/RFB apresenta algumas especificidades, como o fato de exigir que o requerimento do parcelamento seja assinado pelo administrador judicial se já tiver sido deferido o processamento da recuperação judicial.
TJ/SP declara ineficazes cláusulas de plano de recuperação judicial homologado judicialmente
A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, em sede de Agravo de Instrumento nº 2077149-53.2014.8.26.0000, declarou ineficazes sete cláusulas do plano de recuperação judicial da Mabe Brasil Eletrodomésticos, a pedido de algumas de suas fornecedoras de energia elétrica.
Os Desembargadores concluíram que três cláusulas do plano de recuperação judicial eram contrárias à previsão do art. 49 da Lei 11.101/2005, na medida em que incluíram créditos não materializados, nem constituídos até a data do pedido de recuperação e, por conseguinte, não sujeitos aos efeitos jurídicos do plano. O Tribunal afastou, também, cláusula que estabelecia a novação genérica de todos os créditos existentes em face do devedor, sem atentar para o fato de que a Lei 11.101/05 exclui do procedimento recuperatório determinados créditos (entre os quais os previstos nos arts. 5º e 49º, §3º). As demais cláusulas declaradas ineficazes (relacionadas aos efeitos da quitação e à possibilidade de compensação de créditos) traziam termos e condições genéricos, em alegado prejuízo à massa de credores. Ressalte-se que, em julgamento anterior (Agravo de Instrumento 2009742-30.2014.8.26.0000), o TJ/SP já havia declarado a ineficácia de algumas cláusulas do plano de recuperação da Mabe Brasil Eletrodomésticos.
A questão sobre a intervenção judicial no plano de recuperação judicial é extremante importante e muito debatida na doutrina e na jurisprudência, uma vez que está relacionada ao poder de o devedor e seus credores negociarem e deliberarem sobre o plano. A Corte paulista foi pioneira na análise de cláusulas inseridas em planos de recuperação judicial. O Superior Tribunal de Justiça, em 2012, confirmou a possibilidade da intervenção judicial no plano, restringindo-a, no entanto, ao exame da legalidade dos termos e condições apresentados.
STJ confirma a inexistência de foro universal para empresas em recuperação judicial cobrarem seus créditos
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.236.664/SP, consagrou o entendimento de que empresas em recuperação judicial não podem utilizar o juízo em que tramita o processo recuperatório para resolver questões em que figuram como autoras, a exemplo da cobrança de crédito.
O fundamento da decisão está na aplicação analógica da previsão do art. 76 da Lei 11.101/2005, segundo o qual o juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas na Lei de Recuperação de Empresas e Falência, em que o falido figure como autor ou litisconsorte ativo.
A decisão define limites para o processo de recuperação judicial. Segundo o Tribunal, não existe força atrativa do juízo recuperatório quando a recuperanda figurar como credora, situação em que deverá buscar a realização do seu crédito pela via processual adequada, respeitando as regras de competência definidas pelo Código de Processo Civil.
Alienação extraordinária de ativos na falência não exige prévia publicação de edital em jornal de grande circulação
O Superior Tribunal de Justiça, em recente julgado, negou provimento ao REsp nº 1.356.809/GO, interposto por sociedade empresária falida que buscava anular a alienação extraordinária de ativos em bloco, alegando violação dos artigos 140, 142, § 1º, e 144 da Lei 11.101/05. Segundo a Corte, as formalidades exigidas pelo art. 142 referem-se exclusivamente às alienações ordinárias – leilão, pregão e propostas fechadas – e, portanto, seu § 1º, cuja redação exige que a alienação em uma das suas modalidades deve ser antecedida de publicação de anúncio em jornal de ampla circulação, com considerável prazo (15 ou 30 dias, a depender da natureza do bem) para credores, terceiros e o próprio falido tomarem ciência da venda e eventualmente impugná-la, não deve ser aplicado ao caso.
Na fundamentação da decisão, a Corte ressaltou que a alienação extraordinária, regulada pelos artigos 144 e 145, exige apenas que a proposta advinda do Comitê de Credores ou do administrador judicial seja fundamentada e autorizada previamente pelo juiz. Além disso, referiu que, no caso em questão, foram tomadas as cautelas necessárias para a realização da venda (tais como, a oitiva do Ministério Público e publicação de edital na imprensa oficial), sem que interessados tenham apresentado impugnações.
O Tribunal referiu, também, que a necessidade de edital prévio, a ser publicado em jornal de grande circulação, afastaria a diferença existente entre as duas modalidades de alienação (ordinária e extraordinária), prejudicaria a celeridade que operações dessa natureza demandam e poderia impossibilitar a preservação das atividades da empresa, princípio norteador da Lei de Recuperação de Empresas e Falência.
STJ autoriza empresa em recuperação judicial a participar de licitação pública
A Segunda Turma do STJ, por maioria de votos, em decisão proferida em sede de medida cautelar (Ag Rg na MC 23.499-RS) confirmou decisão do TJRS que havia cassado liminar que suspendia o direito de empresa em recuperação judicial – do ramo de soluções de tecnologia, com enfoque comercial no setor público – de continuar participando de processo de licitação pública. O litígio teve início a partir da exigência constante no art. 31, II, da Lei 11.101/05 que exige, para fins de contratar com o Poder Público, a apresentação de “certidão negativa de falência ou concordata expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica”. Ajuizada ação objetivando a dispensa da referida exigência com amparo no art. 47 da referida Lei – que regula a recuperação judicial e a falência –, sobreveio decisão negando a liminar. Em grau recursal, o TJRS deu provimento ao recurso interposto pela empresa, cujos principais fundamentos foram a função social da empresa e o princípio legal de sua preservação.
Desta decisão o Ministério Público interpôs recurso especial e concomitantemente medida cautelar ao STJ na tentativa de agregar efeito suspensivo ao recurso e assim suspender a decisão do TJRS. A suspensão foi obtida liminarmente. Contra esta decisão, a empresa interpôs agravo regimental, ao qual foi dado provimento, por maioria, para fins de cassar a liminar de suspensão, por ausência dos seus requisitos (fumus boni iuris e periculum in mora) e, também, em razão do periculum in mora inverso, uma vez que a sua manutenção poderia comprometer a própria existência da empresa. Diante disto foi extinta a ação cautelar e mantida a decisão do TJRS.
Muito embora o posicionamento do STJ sobre o tema ainda não seja definitivo, é viável antever uma possível flexibilização da exigência legal de apresentação das certidões negativas em referência em prol do princípio da preservação da empresa, o que, se por um lado beneficia empresas que se encontram em situação de crise econômico-financeira, por outro, pode resultar em prejuízo ao interesse público, na hipótese de descontinuidade do serviço prestado ou da redução da sua qualidade em decorrência da situação de crise.