A versão 2.0 da norma de rotulagem nutricional entrou em vigor. E agora?
Após 2 anos de sua aprovação, finalmente entrou em vigor a Resolução RDC nº 429/2020 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que dispõe sobre a rotulagem nutricional dos alimentos embalados.
Essa nova norma foi precedida de Análise de Impacto Regulatório sobre Rotulagem Nacional, na qual a agência identificou a dificuldade na compreensão da rotulagem nutricional pelos consumidores brasileiros como o principal problema regulatório.
Dentre as causas desse problema, estão: (a) dificuldade de visualização e leitura da tabela nutricional; (b) conhecimento e tempo exigido para compreensão da tabela nutricional; (c) dificuldade de comparação do valor nutricional dos alimentos; (d) confusões geradas sobre a qualidade nutricional do alimento; e (e) baixo nível de educação alimentar e nutricional.
A Anvisa, então, traçou cinco objetivos principais que deverão ser alcançados com a nova norma: (a) aperfeiçoar a visibilidade e legibilidade das informações nutricionais; (b) reduzir as situações que geram confusão ao consumidor quanto à qualidade nutricional do alimento; (c) facilitar a comparação nutricional entre os alimentos; (d) aprimorar a precisão dos valores nutricionais declarados; e (e) ampliar a abrangência das informações nutricionais.
De todo modo, de acordo com a regra de adequação, os objetivos dessa norma não serão percebidos de imediato, já que enquanto os novos produtos lançados a partir de 09 de outubro de 2022 devem cumprir os novos requisitos, os produtos que já estavam em circulação terão prazos de transição para a regularização e substituição gradual dos rótulos pelos próximos três anos, observando prazos distintos fixados por categorias de produtos indicados no artigo 50 da Resolução.
Contudo, independentemente desses prazos de adequação, como a maioria das empresas do setor terá de conviver com produtos antigos e novos, é essencial que elas entendam e reforcem seus procedimentos para o cumprimento da nova resolução, a fim de evitar a inserção intencional ou não, de informações inverídicas e/ou em desacordo com as normas do país na rotulagem nutricional que podem induzir o consumidor a erro.
De certo, as irregularidades e inadequações nas indicações obrigatórias nos rótulos nutricionais, ainda que o produto esteja próprio para consumo, além de serem passíveis de fiscalização, não só pela própria Anvisa, também suscitam ações de fiscalização sob o aspecto consumerista.
É nesse contexto que se torna importante para a indústria conhecer os parâmetros adotados pelo Procon para o cálculo das multas administrativas.
Como se sabe, cada Procon, respeitando os parâmetros estabelecidos pelo Decreto 2.181/97, pode estabelecer procedimentos para determinar e impor sanções no âmbito da defesa do consumidor. Bem por isso, o Procon do Estado de São Paulo, por meio da Portaria nº 45/2015, formulou novos parâmetros para a quantificação dos valores das multas a serem aplicadas, devendo ser considerado, então, o porte econômico da empresa, a gravidade da infração e a vantagem econômica obtida.
Em um primeiro momento, a criação de uma fórmula para a valoração da multa parece medida adequada e desejável. No entanto, na prática, percebe-se que as fórmulas ora existentes resultam em multas extremamente elevadas, em desacordo com os princípios estabelecidos em lei.
Como exemplo, vale citar duas penalidades acima de R$ 10 milhões, cada (valor máximo permitido em lei) aplicadas pelo Procon/SP, em razão da não observância das regras de rotulagem.
A primeira, no valor de R$ 10.255.569,96(dez milhões, duzentos e cinquenta e cinco mil, quinhentos e sessenta e nove reais e noventa e seis centavos), aplicada em razão da rotulagem de Cereal de empresa multinacional do setor conter a listagem dos ingredientes em desacordo com a ordem decrescente exigida pela RDC 259/2002 da Anvisa.
Já a segunda multa, no mesmo valor, foi aplicada em decorrência da venda de bebida alcóolica mista sem que o prazo de validade tivesse sido informado.
Diante desses valores extravagantes, a questão, portanto, reside na discussão sobre a real capacidade das multas cumprirem sua função social, isto é, de desencorajar a incorrência ou perpetuação de condutas reprováveis no âmbito consumerista.
Por um lado, as multas meramente simbólicas não cumpririam sua missão constitucional de proteger e defender as relações de consumo.
No entanto, valores extremamente altos também possuem seu lado negativo. Ainda que, em tese, pudessem contribuir para a proteção do consumidor, cifras muito exageradas podem inibir desproporcionalmente a atividade econômica das empresas e seu crescimento.
Com a finalidade de evitar eventuais penalidades, as empresas devem se atentar aos prazos estabelecidos pela Anvisa para adequação de seus produtos às novas normas.
Nesse cenário, além do claro desígnio de melhor informar o consumidor, ao observar a nova norma, as empresas estarão proativamente se protegendo da discussão hoje em voga sobre a dosimetria e naturais contratempos com as altas multas em controvérsia. Essa precaução revela-se razoável diante do advento de uma nova norma que torna possível a intensificação das ações de fiscalização da rotulagem de produtos nas diferentes esferas de atuação das autoridades de defesa do consumidor e do sistema nacional de vigilância sanitária.