23.03.2015 – Resolução de Conflitos – Edição 09

A EXTENSÃO DA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA POR VÍCIO DO PRODUTO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO
De acordo com o artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), os fornecedores (tanto fabricantes, quanto comerciantes) respondem solidariamente pelos vícios apresentados pelos produtos que colocarem no mercado. Na doutrina e nas cortes estaduais predomina o entendimento de que essa solidariedade ensejaria ao comerciante o dever de receber os produtos viciados para os encaminhar à assistência técnica do fabricante, devolvendo-os reparados ao consumidor. Contudo, ao julgar o Recurso Especial nº 1.411.136 – RS, interposto em ação civil pública, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que o envio do produto viciado pelo consumidor diretamente à assistência técnica viabiliza que o fabricante cumpra o seu dever de reparar o produto, ao mesmo tempo em que viabiliza a satisfação do direito do consumidor de ter seu produto reparado, desde que o serviço seja disponibilizado “de forma efetiva, eficaz e eficiente”. Segundo essa decisão, quando houver assistência técnica disponível no mesmo município do comerciante, ele não tem o dever de receber os produtos viciados. Se assim não fosse, haveria aumento do tempo de reparo do produto e acréscimo de custos ao consumidor. Portanto, somente na ausência de assistência técnica no mesmo município do comerciante é que persiste o dever de receber os produtos viciados e providenciar a remessa à assistência técnica do fabricante, visto que nesses casos, haveria uma dificuldade excessiva imposta ao consumidor. A orientação adotada deverá influenciar as futuras decisões das cortes estaduais, gerando nova reflexão e conclusões sobre o tema.


IMPENHORABILIDADE DE REMUNERAÇÃO APLICADA EM FUNDOS DE INVESTIMENTO
Determina o artigo 649, inciso IV do Código de Processo Civil que a verba salarial é impenhorável. O inciso X do mesmo artigo dispõe ser também impenhorável o valor depositado em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos. A razão que embasa os dispositivos é a mesma: garantir o mínimo existencial ao devedor, evitando privá-lo de seu sustento em razão da execução de uma dívida. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), até recentemente, entendia ser penhorável a verba salarial utilizada em aplicações financeiras (à exceção da poupança), por uma aplicação restritiva e literal do inciso X, entendendo, ainda, que tal aplicação financeira desconfigurava a natureza salarial do valor, já que não utilizada para o sustento imediato do empregado e sua família, afastando assim a incidência também da proteção do inciso IV. Tal entendimento foi revertido nos Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.330.567-RS, nos quais a Segunda Seção do STJ – órgão que reúne os ministros da Terceira e Quarta Turmas e possui competência para analisar matérias de Direito Privado – determinou que deve ser dada aplicação extensiva aos dispositivos, garantindo a impenhorabilidade de quaisquer aplicações financeiras até o limite de 40 salários mínimos. O colégio de ministros concluiu que a aplicação em fundos de investimento tem essencialmente a mesma função que aquela feita em caderneta de poupança, i.e., resguardar o futuro do próprio depositante e de seus beneficiários, garantindo o recebimento futuro de certa quantia que julga ser suficiente para a manutenção de seu atual padrão de vida. O mesmo ocorre, aponta o julgado, ainda que haja investimentos em fundos diversos, desde que a soma não ultrapasse o limite legalmente previsto de 40 salários mínimos.


VÍCIO E FATO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO, PRAZO PRESCRICIONAL PARA AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS E O POSICIONAMENTO DO STJ
O STJ, em recente julgamento (REsp nº 1.176.323-SP), reiterou entendimento sobre a diferença entre vício e fato do produto ou do serviço para fins de aplicação dos prazos decadencial e prescricional previstos, respectivamente, nos artigos 26 e 27 do CDC. A Terceira Turma entendeu que vício é aquele que afeta tão somente a funcionalidade do produto ou do serviço. Nessa hipótese, o consumidor terá de exercer seu direito de reclamar no prazo decadencial de 30 ou 90 dias, conforme se tratar de produto ou serviço não durável ou durável, nos termos do artigo 26 do CDC. Por outro lado, caso esse vício seja grave e cause dano indenizável ao patrimônio material ou moral do consumidor, restará configurado fato do produto ou do serviço, hipótese na qual a pretensão à reparação de danos deverá ser exercida dentro do prazo prescricional de cinco anos, nos termos do artigo 27 do CDC. Embora tribunais estaduais já tenham se manifestado nesse sentido, ainda persiste corrente diversa, no sentido de que fato do produto ou do serviço é tão-somente o acidente de consumo em razão de defeito referente à segurança que se espera do produto ou do serviço, e não o vício acrescido de um prejuízo sofrido. Dessa forma, o artigo 27, interpretado em sua literalidade, não estabeleceria prazo prescricional às situações de vício do produto ou do serviço, motivo pelo qual deveria ser aplicado à pretensão indenizatória daí decorrente do vício o prazo prescricional de três anos previsto no artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil. A tendência, no entanto, é que se mantenha o entendimento do STJ, por ser interpretação favorável ao consumidor.


NOVO CPC: VETADOS OS DISPOSITIVOS RELATIVOS À CONVERSÃO DE AÇÃO INDIVIDUAL EM AÇÃO COLETIVA
Em 16 de março de 2015, foi sancionado o novo Código de Processo Civil, com entrada em vigor prevista para 17 de março de 2016. Foram vetados, além de outros dispositivos, o inteiro teor do artigo 333 e o inciso XII do artigo 1.015, que tratavam da conversão da ação individual em ação coletiva. O instituto permitiria, em caso de relevância social da ação e dificuldade de formação do litisconsórcio, que o juiz convertesse em coletiva a ação individual que houvesse alcance coletivo, assim compreendidas aquelas que veiculassem pedidos (i.) de tutela de direito difuso ou coletivo em sentido estrito e (ii.) de solução de conflito relativo a uma mesma relação jurídica plurilateral, cuja solução devesse ser uniforme. Em ambos os casos, seria vedada a conversão para o fim de tutelar direitos individuais homogêneos. As razões oficiais dadas para o veto presidencial, cuja sugestão foi dada pela Advocacia-Geral da União e pela Ordem dos Advogados do Brasil, referem que, em razão da forma em que redigidos os dispositivos, o instituto poderia ser utilizado “de maneira pouco criteriosa, inclusive em detrimento do interesse das partes”.

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